Quando descobriram que poderiam pensar, formar interpretações do que viam fora de si; ficaram assustados, talvez. Mas, nisso, continuaram a seguir. Tocavam as pedras, árvores; caçavam outros animais; olhavam os astros; sentiam o cheiro e escolhiam o que comer; juntaram as primeiras peças; formaram o vestuário; usaram o fogo, as panelas, os temperos; depois, foram crescendo nessa velocidade insistente de recriar o cenário aonde pudessem plantar suas primeiras sementes, tanger suas reses, armar seus artefatos. Desvendavam, daquele jeito, um eu que bem poderia dominar os outros, decerto pensaram certa vez.
E insistiram prosseguir na sanha de fervilhar o Chão e
trabalhar os pensamentos, fazer planos, prever acontecimentos, desmatar,
construir as primeiras cabanas, formar tribos iniciais, as famílias, os reinos.
Lá mais adiante, estabelecer princípios, descobrir fórmulas, fabricar
instrumentos. Nisto, viram nos demais seus objetos de domínio. Daí, vieram as
armas de combate, as batalhas, os pelotões de ataque e defesa, e as fortunas
individuais do poder político.
Nesse território farto de superações, chegaram, certa feita,
a experimentar o princípio da precisão e estabeleceram as máquinas originais
feitas de materiais achados no solo. Acendia, qualquer vez, a expectativa de
acelerar o processo e dormirem à sombra das posses adquiridas.
Naquela fase além do ferro, vieram os conceitos mecânicos, a
eletricidade, o motor a explosão, os meios de comunicação; isto numa velocidade,
a bem dizer, compatível à capacidade do que lhes acontecia no juízo. Até quando,
recente, os meios avançados da ciência do invisível a olhos nus, fizeram os
voos siderais, e, da matemática refeita nas palavras e na inteligência, que
denominaram o artificial, criando outro cérebro no vácuo das compreensões
ordinárias.
Então, dessa imaginação fértil e do desejo insistente de acertar,
vive-se, agora, tempo surreal, passadas que foram as previsões imediatas
daquele passado romântico. Aqui se estabelecem, pois, fases inesperadas, porém
vistas antes nos filmes de ficção científica, de entes amorfos, criados pelos
humanos e tão poderosos quanto, ou, quem sabe?, dotados de capacidade autônoma de
querer independente, eles, os tais seres abstratos, nascidos da mesma força inicial
do próprio pensamento dos indivíduos, porém, no instante, ao penhor de grupos
donatários da realidade, esquivos e fortes, a planos de controlar e gerir a grande
multidão.
(Ilustração: Metrópolis, de Fritz Lang).
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