Nada mais que isso é o que somos... Máquinas de ver passar o tempo, no entanto submissas a questões fundamentais. Notas da sinfonia magistral do instante, ainda buscamos a pureza da nossa sonoridade primeira. Lembro de certo trecho do livro A erva do diabo, de Carlos Castañeda, moda nos anos 60, quando, após receber os ensinos de Dom Juan, dele se despede o feiticeiro, deixando-lhe, porém, uma tarefa a cumprir, prova de haver aprendido as lições. Já tarde da noite, numa casa abandonada onde se achavam, em um deserto do México, Castañeda haveria de encontrar o seu lugar na varada escura dessa habitação utilizando nisso um pequeno palito de fósforo, a medir passo a passo todo o chão. De certeza, ali estaria aquele ponto só a ele destinado.
No frenesi de corresponder aos seus anseios, seguiu
exaustivamente noite adentro, indo, afinal, cumprir a tarefa quase nos claros
da madrugada.
Quais assim vivemos, de buscar o lugar a que nos destinamos,
peças soltas de uma engrenagem insólita. Tateamos o mistério, espécies de
lesmas da alma, na gana de revelar a que aqui nós estamos. Por vezes, tratamos
de inventar nossas próprias regras, contudo detentores das restrições impostas diante
da ordem do Universo, por si virtuosa em tudo. Palmilhamos as folhas do momento
presente, experimentamos as determinações da incerteza e sussurramos canções as
mais diversas, e tantas horas ausentes da composição original a que devemos
cumprir com fidelidade e receber o prêmio dessa Verdade.
São tantas as visões do que resta viver, todavia tanto desencontradas
da real condição de vencer os desafios da sorte ainda incerta. Vele que seja
desse modo, porquanto outro jeito jamais haverá de existir o que não
corresponda aos valores definitivos da determinação do Ser perfeito de quem
somos diletos filhos. Enquanto isto, no alto dos céus, deslizamos as vidas no
simples gesto de sonhar com o Sol pleno das manhãs primaveris.
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