quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016
Quadros e galerias
Os melhores quadros nunca chegam às galerias. As melhores inspirações nunca passam além do peito, isso porque não conseguem sair e dizer o próprio nome em forma de significado. E aqueles que as encontram e recebem em si próprios, jamais resistiriam dizer de tanta beleza, contar de tanta poesia, porquanto a força incontida do viver impõe a isso condições inestimáveis. Quantas vezes vêm sendo assim, pelos séculos sem fim, de se saber de coisas lindas, nos sonhos, nas manhãs agradáveis, e não saber, hoje, amanhã, nos outros dias, transmiti-las em termos artísticos. Olhar o céu, o mar, a serra, o sol; sentir a energia do som, da brisa, e não se conseguir falar de tais qualidades, impossíveis de caber em nossos pensamentos, nas palavras, nos versos, nos sons, nas telas, nos filmes, nas fotografias... Os mais destacados artistas, todavia, insistem e se entregam ao ofício de colher as flores do tempo e oferecê-las em forma de criação, para passarem de mão em mão, querendo eternizar o fugidio, multiplicar o momento, dizer de tanto mistério, e não buscar adquirir o poder das coisas perfeitas, trazê-las em códigos, passá-las além de si. Muitos até que um pouco disso conseguem, mas, sendo desse jeito, poucos são aqueles que se apercebem de tanta beleza, do tanto de poesia que transmitem os maiores artistas, para passar de mão em mão os painéis inimitáveis da Natureza, no quadro desta vida, querendo através do sonho da arte eternizar o fugidio, domar o indizível, multiplicar o momento, vencendo a impossibilidade de passar além do peito as maiores inspirações, as fazendo sair, quase sem conseguir, lançando além das vagas as doces mensagens infinitas da vagas e brisas. Isto porque os melhores quadros nunca chegam às galerias... Aqueles que os encontram silenciam, no sentido de tanta beleza, tanta poesia, a lhes doer dentro do peito, falando de algo que não podem passar além de si, porque não conseguem transmitir, dominar o momento, satisfazer o fugidio. E ficam, desse modo, a contar só as notícias daqueles melhores momentos, quadros esses que existem nas folhas soltas dos dias, nas luzes eternas da existência, porém que jamais chegam às galerias. Diz o credo taoísta, religião chinesa de alguns milênios passados, sujeite-se ao efeito, e não busque descobrir a natureza da causa, modo de querer paz, em face de tudo que neste mundo aconteça. Feridas pedem tratamento. As palavras adormecem nos livros, almas vivas, nas luzes do sentido leve das coisas. Ontem, amanhã, cada dia..
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário