quarta-feira, 14 de maio de 2025

Flores na estrada


Dias atrás, numa dessas ocasiões em que se aguarda pelos outros para cumprir os passos das rotinas, parado, avistei, diante de uma residência, a poucos metros, ramos floridos de papoula que se projetavam por sobre o muro. Daí, qual penetrando numa fresta da mente, me peguei a desenvolver algumas considerações pessoais conseqüências do que via.

Planta comum o ano todo, essa flor, a papoula, se multiplica com imensa facilidade, a colorir as ruas dentro de absoluta generosidade. Nisso, deslizei a pensar um pouco mais nas flores, em todas elas, nas flores inúmeras e variadas, espalhadas neste chão.

Coisa simples e fora de aparentes necessidades, uma flor de cujo arbusto não nascem frutos alegra a paisagem, tão só, num desafio à monotonia das cores, de causar admiração, revestindo o desenho vário e os formatos neutros dos muros e paredes de profusões e tons só comparáveis, no estilo, ao que promovem os também pouco prestigiados pássaros e borboletas.

Porém como a Natureza exerce perfeição num gesto máximo ao elaborá-los, dando, com isso, um banho de maestria ao produto final da beleza, realçada pela intensidade do Sol a cada manhã, cada tarde.

De cores inimitáveis, traços matemáticos, estética indiscutível, todas elas, as flores deste mundo, surgem inúteis, de presença fluida, expandem pólen e perfume, trabalham suaves e cumprem a missão do futuro nas asas do vento, dos pássaros e dos insetos.

Alegria em meio ao comboio dos homens práticos na ação da sobrevivência e do poder, ousadas, elas quebram, com a leveza da flexibilidade pura, os teoremas bizarros das tecnologias de resultados úteis, econômicos, financeiros. Lições insistentes, abrem suas pétalas ao sereno da noite e à luz da alvorada, quais gigantes desafiadores do pessimismo que insiste em querer toldar a paz social.

Depois daquela hora vaga de sentido, talvez comparável o sentido das flores, noto quanta promessa de amor elas reúnem, para sumir nas dobras do tempo, livres de luxo, aparato ou ostentação.

Seguia nesses raciocínios despretensiosos, quando recordei de um episódio lido a propósito da vida de madre Tereza de Calcutá. Certa ocasião, profissional da imprensa indagou sobre a relevância do que ela fazia pelos pobres e doentes da Índia, trabalho incansável e desinteressado, o que, segundo o jornalista, não passava, no entanto, de pouco ou nada, mera gota d’água perante o oceano imenso das tantas necessidades daquele povo.

Naquela hora, sem titubear, a freirinha respondeu: Sim, meu filho, mas sem essa gota d’água o oceano seria menor, palavras rápidas e profundas, de significado que, nesta hora, quero comparar à importância das flores em face dos mistérios infinitos da razão. Sem as flores, quanta gota d’água apenas anônima rolaria no desconhecido, a brilhar fora das vistas ansiosas, por vezes tristes, por vezes alegres, de todos nós, os viventes humanos!

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