Dias atrás, numa dessas ocasiões em que se aguarda pelos outros para cumprir os passos das rotinas, parado, avistei, diante de uma residência, a poucos metros, ramos floridos de papoula que se projetavam por sobre o muro. Daí, qual penetrando numa fresta da mente, me peguei a desenvolver algumas considerações pessoais conseqüências do que via.
Planta comum o ano todo, essa
flor, a papoula, se multiplica com imensa facilidade, a colorir as ruas dentro
de absoluta generosidade. Nisso, deslizei a pensar um pouco mais nas flores, em
todas elas, nas flores inúmeras e variadas, espalhadas neste chão.
Coisa simples e fora de aparentes
necessidades, uma flor de cujo arbusto não nascem frutos alegra a paisagem, tão
só, num desafio à monotonia das cores, de causar admiração, revestindo o desenho
vário e os formatos neutros dos muros e paredes de profusões e tons só
comparáveis, no estilo, ao que promovem os também pouco prestigiados pássaros e
borboletas.
Porém como a Natureza exerce
perfeição num gesto máximo ao elaborá-los, dando, com isso, um banho de
maestria ao produto final da beleza, realçada pela intensidade do Sol a cada
manhã, cada tarde.
De cores inimitáveis, traços
matemáticos, estética indiscutível, todas elas, as flores deste mundo, surgem inúteis,
de presença fluida, expandem pólen e perfume, trabalham suaves e cumprem a
missão do futuro nas asas do vento, dos pássaros e dos insetos.
Alegria em meio ao comboio dos
homens práticos na ação da sobrevivência e do poder, ousadas, elas quebram, com
a leveza da flexibilidade pura, os teoremas bizarros das tecnologias de
resultados úteis, econômicos, financeiros. Lições insistentes, abrem suas
pétalas ao sereno da noite e à luz da alvorada, quais gigantes desafiadores do
pessimismo que insiste em querer toldar a paz social.
Depois daquela hora vaga de
sentido, talvez comparável o sentido das flores, noto quanta promessa de amor
elas reúnem, para sumir nas dobras do tempo, livres de luxo, aparato ou
ostentação.
Seguia nesses raciocínios despretensiosos,
quando recordei de um episódio lido a propósito da vida de madre Tereza de
Calcutá. Certa ocasião, profissional da imprensa indagou sobre a relevância do que
ela fazia pelos pobres e doentes da Índia, trabalho incansável e desinteressado,
o que, segundo o jornalista, não passava, no entanto, de pouco ou nada, mera gota
d’água perante o oceano imenso das tantas necessidades daquele povo.
Naquela hora, sem titubear, a
freirinha respondeu: Sim, meu filho, mas sem essa gota d’água o oceano seria
menor, palavras rápidas e profundas, de significado que, nesta hora, quero comparar
à importância das flores em face dos mistérios infinitos da razão. Sem as
flores, quanta gota d’água apenas anônima rolaria no desconhecido, a brilhar fora
das vistas ansiosas, por vezes tristes, por vezes alegres, de todos nós, os viventes
humanos!
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