Viver tem disso, de sobreviver com esse mundo de imaginação
atravessado na garganta e assim pensar que ficaria para sempre ligado ao útero
materno... Acreditar-se eterno e penhor da carne, e desconhecer o tempo que lhe
veio grudado ao céu da boca do ser quando e quanto seja... Supor-se artefato
fantástico das lojas flutuantes no espaço apenas biombos gigantes, quais balões
das festas em noites siderais... A máquina me faz pensar...
Serem porém destarte antes de ser todavia. Sobrevoar a
própria sombra, numa certeza abstrata de querer dominar a luz que lhe alumia
longe de seu poder, meros agônicos que sejam, contudo embriagados nas fantasias
todo momento. Tais seres dependurados pelos cordões das calças deixados lá fora
logo depois dos primeiros raios do Sol.
A ilusão do feto é isto de acreditar que permaneceria para
sempre no útero da mãe, sem contar os dias que viriam pela frente na tempestade
inevitável dos giros sucessivos da Terra. Vítimas, pois, dos créditos que a si
ofereciam, paira inútil pelas marcas de pulsar das gerações incontidas. Eles,
os magos da solidão acompanhada, enquanto aqui estejam a braços nas visões
estonteantes dos gestos de acreditar que alimentaria livres fios de sacolas do
imaginário popular.
Isso de agora aceitar a condição destas bólides em movimento
nesse mar das contradições que ele mesmo criara na ânsia de preservar o destino
impossível, nos passos das sombras agonizantes.
...
Chega, entretanto, a ocasião propícia do confronto, no solo
em que plantou a consciência, e receber o resultado de exames feitos na lei que
aguenta os céus, e aceitar o preço inevitável do que tanto sustentou sua
fórmula mágica de ilusão. Admitir só então o inútil daquilo em que estabelecera
que se diluísse na alma imortal e achar a visão do Absoluto vindo bem de dentro
da carne em que aprendeu a existir.
Ele, que nunca fora filho do seu querer, contudo de aceitar
nascer, vir à luz nas dores da libertação, pequeninos frutos de árvores
monumentais, marcas determinadas pelos deuses nos humanos corações, até que o Tempo
de vez cumpra de todo o preceito que quis de ser o senhor dos sonhos até há
pouco inexistentes.
(Ilustração: Provérbios alemães, de Pieter Bueguel o Velho).
Viver é assim mesmo viver uma eterna ilusão de que a vida começa todos os dias. Feliz ou não temos que seguir em frente.
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