segunda-feira, 9 de junho de 2025

As férias de julho


Depois de virmos morar em Crato, na segunda metade de 1953, ano do centenário do município, só voltávamos ao Tatu nas férias de julho. Isso por conta do ano escolar e das moagens do sítio, que coincidiam na programação da família. Havia transcorrido o período chuvoso, que aumentara as águas dos açudes e trazido um clima menos quente ao Sertão cearense.

Logo da primeira vez, foi de causar espanto face a tanta saudade acumulada naquele menino de cinco anos, retirado das origens num repente. Ao chegar, saía na procura do que havia deixado lá atrás; os animais, as lembranças dos lugares, a capelinha, nossa casa, a casa grande, as árvores, cercas, currais, engenho, os moradores, as famílias deles, os amigos, tudo enfim. Uma sensação de rasgar o peito, passados que foram tantos meses de ausência daquele mundo ali guardada no peito há tantos meses.

As primeiras oportunidades anuais, no entanto, terminavam com o transcorrer dos dias, e, de novo, a dor das novas ausências apenas realimentadas daí a um ano inteiro. Porém aos poucos iria me enfronhando com a cidade que nos recebera; as escolas, os colegas, as ruas e praças, sorvetes e picolés, pão do reino, revistas, livros; as distrações urbanas, os filmes; sim, os filmes de cujos cartazes a gente tomava conhecimento algumas semanas antes da exibição.

Qual que espécie de contração íntima, quem sabe? numa traição àqueles amores antigos ali abandonados, me examinava a sinceridade aos meus apegos de um passado tão amoroso posto de lado à conta de novos amores. E isto mexia comigo, a cotejar num exame de consciência que ainda hoje passo a lembrar. Aonde perdera minha história, em que verão escorrera da memória aquele passado inesquecível?!

No transcorrer, pois, disso tudo, agora examino por dentro meus sentimentos à cata dos tais valores que o Tempo se encarregou de transformar... É quando mais insisto nessa busca de preservação, ao contar, pouco a pouco, nos mínimos detalhes de mim próprio, a intenção imaginária de me reencontrar e viver sempre essa fase de vida original e verdadeira que uma vez conheci e não desejo nunca perder, jamais.

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