sábado, 31 de maio de 2025

As razões do Paraíso


De quando em vez me deparo com algumas dessas indagações nascidas sei lá de onde. Querem (quem sabe quem?!) descobrir a razão doutras evidências. Perguntam, nisso, as razões do Paraíso que ninguém sabe dizer aonde fica e vive na memória das pessoas. De se haver estado ali e, de uma hora a outra, sair pelo mundo na busca dos motivos de existir, mesmo havendo nascido naquele universo rico em tudo e desaparecido, no entanto. Ao sabor das compreensões dos que narram as circunstâncias, restam mil versões. Mesmo sendo filhos de tão distinto Pai, sair, vidas e vidas, a buscar justificativas próprias de existir, desde então, e caminhar num deserto de compreensão.

Nisto, no senso dessas perguntas trazidas de pensamentos e palavras, quer-se encontrar a nitidez daquilo, daquela primeira chance, assim transformada no êxodo que ora vivem. Responder, que seja, ao enigma da presença neste Chão, isto de forma coerente, livre das ficções que percorrem no Infinito. Deparar de tudo, naquilo contado nas muitas ocasiões e por demais aceito quase que numa unanimidade pelas filosofias, histórias e tradições.

Daí, o percurso traçado pela imaginação em dizer dos acontecidos, desde então, transformados na longa história da raça. De alguém, filho do Eterno, que defronta a inocência original e haver de cumprir esse ditame que bem resume o que viria em seguida, depois dos primeiros gestos de liberdade.

Sem querer ultrapassar as interpretações dos credos e crenças, no entanto, existiu, certa feita (quero crer), um paraíso na consciência das pessoas. Alguns, talvez, que agora estejam revivendo e ansiando, sobremodo, regressar aos primórdios do quanto havia nos primórdios, porém ainda cercados de perquirições às vezes vencidas diante da raridade de se fazer ciente; alguns. Enquanto isto, tudo mostrar a clareza de uma perfeição nos quantos mistérios em volta, no íntimo dos sentimentos, a denotar o caminho aberto desse reencontro consigo mesmo, a ponto de viver, em Si, até sempre, os céus do Paraíso que eles buscam.

quarta-feira, 28 de maio de 2025

A certeza do inesperado


As imprevisões que bem caracterizam o contar dos milênios moram em todos e nos objetos sacudidos ao vento. Desse fluir do incontrolável sobrevive o desejo dos sonhos das noites. Fixos num depois tão só imaginário, observam a consistência no Tempo, seus passos insólitos que deixam rastros inamovíveis. Os habitantes, pois, dessa vastidão continental das esferas desfilam nas sombras e cogitam daí, lá um dia, dar de cara com o princípio da incoerência e adormecer de vez no deserto da imaginação.

Por isto, as quantas vidas, silentes, astutas, sórdidas, geração após geração, nos velhos campos de batalha de antanho. Fossem assim considerar o ritmo dos sóis, saber-se-iam da certeza absoluto do instante atual, única verdade absoluta no campo das virtudes. Porquanto ansiosos às novas descobertas de mundos inexistentes, acalmam os ânimos à borda de quantos mares, solitários aventureiros dos filmes que hoje apenas dormem nas ruínas das próprias veias. Marcas indeléveis de lembranças ferradas na pele que os possui, examinam as inscrições pré-históricas esquecidas pelas cavernas ali deixadas, de quando acreditavam no instinto de realizar mudanças onde residem os mesmos morcegos de antigamente.

Nisto, a linha divisória entre antes e depois, que percorre a solidão de estar aqui sem desvendar o mistério de sejam feitos. Ainda que destarte, abandonam a intenção de revisar a História, vilões dos astros e parceiros das ilusões.

Sei serem propensos a interpretar belas canções, enquanto veem cruzar estradas sem fim na busca dos seres inexistentes, almas e visões assustadoras. Persistem, todos sabem, naquilo que alimentam e se alimentam deles. Esses possíveis heróis dos romances arcaicos, maestros e autores das sinfonias esplendorosas que virão logo depois de ultrapassar o sentido de tudo quanto existe, amanhã bem cerdo.

E túnicas bordadas de letras escarlates preenchem o claro das horas de fantasias e frases ora vistas a olhos nus dentro das telas do futuro inominado.

domingo, 25 de maio de 2025

As artimanhas do Destino


Entre Tudo e Nada, bem ali habita, numa cabana esquecida, o Tempo e as pessoas. Ambos cercados de circunstâncias, e conduzem lentamente o foco do que existe e existirá, indiferentes, no entanto, ao senso do definitivo. Quais, deixam correr o rio das horas através das veias do inexistente. Nesse âmbito inexplicável transitam as multidões inteiras, livres, talvez, do princípio da espontaneidade original. Transitam e obedecem, e dormem logo adiante, nas ruínas de um passado inapelável.

São inúmeras as chances de avistar o fim dos abismos, todavia de olhos por certo ainda fechados à raiz dos acontecimentos; perenes seres andam soltos no palco das ocasiões e se deixam ofertar nos altares dos sacrifícios, isto, por vezes, mas, por cima, cheios de fulgor e vaidades.

Fortes atitudes desse impossível proceder persistem de tal modo que impõem condições inevitáveis às criaturas que as adotam em tais procedimentos, e deixam sobre as palhas que disso resultar. Alimárias do Ser Absoluto, cumprem nisto papeis justos, determinados. Obedecem ao mecanismo da própria consciência, contudo. Firmam pés na crosta deste Chão e só repetem o pouco daquilo que lhes chegar aos sentimentos.

Fôssemos, pois, avaliar os extremos aonde chegar e tão só ilustraríamos as artes de que nos fazemos crer. Daí o desejo incontido das crenças, dos valores, das aventuras humanas em tantos universos até quando despertar na verdade donde vêm todos, seres e objetos, tradições e movimentos, ilusões e conhecimentos. Um exército de pudores a ilustrar o foco das alturas, nós, minúsculos amores dos sonhos em movimento.

Passados foram, por isso, os perenes milênios, enquanto apenas aprendíamos a tocar o firmamento com mãos inseguras, tateando o escuro das distâncias entre os dias e as noites, no sabor de sobreviver, a quanto custo, nessa jornada silenciosa rumo à linha tênue que divide o Ser e o Nada.

sábado, 24 de maio de 2025

De onde vem a inspiração


Decerto do silêncio, eu sei. Mas no sabor doutras tantas versões da realidade. Do limbo desse universo de nós, onde moram os trâmites das certezas, às portas ainda cerradas do coração. Quantas e tantas histórias ali pernoitam na alma da gente. Pessoas inesquecíveis. Momentos inigualáveis. Da saudade. Dos sonhos. Do movimento das cores na visão. Dos livros. Das músicas. E mesmos das próprias palavras, que falam a perder de vista. E, quem sabe?, das ilusões. Das folhas em branco. Do teclado afoito, às nossas mãos. Do desejo de transformação. Nisso, ela vive solta, qual pedras numa caixa misteriosa que carregamos conosco aonde formos. Fala, grita, insiste dizer, sair ao relento das horas, neste mundo ainda tosco das notícias, das aspirações, da multidão, dos anseios dos dias melhores, dos amigos que existem nalgum lugar.

Nessa área de trabalho da presença da gente com a gente mesma, abre as fronteiras abertas do inesperado, é que dali surge a inspiração. Sussurra junto de nós suas aventuras errantes na pátria da solidão, e nisto elabora as luzes da Consciência, dias e dias, em pedaços de jornadas misturados com o tempero das poucas cartas que lhe chegam da Eternidade. Conquanto saiba bem mais que o instinto afoito, no entanto padece, também, dos instantes de agrura quando presencia o caudal das perdições e nada pode evitar. Cortejada, pois, pelas distâncias, cresce sempre ao romper da aurora, percorre o território da dúvida, numa espécie de vigilância incontida, depois de rever tudo em volta, e naquilo devorado o passado que sobrevive na barriga dos destinos.

Vimos, vem em quando, transcorrer à nossa frente esse ente desconhecido, vindo de lá ninguém sabe onde a seguir aos lugares fugidios, a braços com lembranças perenes na forma dos inocentes autores do Infinito. Todavia, cercada de visagens encapuzadas, soturnas, a pedir reza e cantas loas aos pastos da ausência bem ali adiante. Ela dorme nos grotões da sequência natural dos pensamentos, afeita que foi, um dia, ao espetáculo inigualável do Sol.

sexta-feira, 23 de maio de 2025

As saracuras da Serra


Aos finais das tardes, nem tão escuro ainda, se ouve na distância o canto delas, as saracuras (ou três potes), aves pernaltas, isto numa intensidade de causar espanto. Sei que avisam de algo, talvez até delas mesmas desconhecido. Cantam de um tanto de tudo em volta. Do dia que some, pouco a pouco, diante das sombras da noite; do silêncio que chega no pausar da solidão; das horas em desafio nas vidas em movimento, no que resta em volta antes de sumir as visões no pouso do fim do dia.

A que pensar senão escutar a imensidão do firmamento, das águas que escorrem pelas frestas raras das matas donde vem o canto inesperado. Nisto, fala a imensidão através das figuras apressadas a caminho de casa. Em tudo, seres pequeninos diante do mistério ali presente nesses detalhes do instante. Um vendaval de pensamentos perfaz o resto daquele universo guardado na alma da natura. Elas dizem, longe, do pouco ao nada em volta. Apenas os sonhos de querer conhecer, nisso que vivem tantos.

E nesse meio tempo, tudo o mais há de prosseguir, seja lá onde. As guerras, os tumultos financeiros, as explorações dos grupos, a fome, o tanto que for, quando uns querer ser maior que outros no descompasso que alimenta a ganância.

No recôndito das matas, no entanto, a Natureza impõe suas marcas profundas ao coração dos seres, na certeza de que existe algo definitivo além, livre das opiniões gerais. Poder inigualável assim observa de perto o ritmo dos momentos e definirá, na ocasião precisa, o sentido desse estágio das populações pelos limbos da aventura. Ao sabor das palavras, pois, os séculos respondem ao próprio enigma e sobrevive nos conceitos apenas precários das criaturas humanas. Fôssemos deixar por conta do acaso e os céus despareceriam no Infinito.

Essa trilha sonora do silêncio explica o motivo de tocar o senso dos destinos e jamais esquecer a alegria do íntimo do Ser. Viver qual razão essencial das existências, em nós e no quanto existe, durante as eras inesgotáveis do mistério.

domingo, 18 de maio de 2025

Aos confins do Universo


Bem ali onde ninguém há de chegar jamais, a não ser através das ficções científicas, dali nascem os entes que o somos e porejamos, à medida do haver em crescimento. Astutos seguidores de sonhos inimagináveis, tangenciamos pela pauta das existências em aparentes objetos atirados ao vento, no entanto ora alimentados nos laços abertos do Infinito. Desejamos, nas incontáveis situações, crer em nós mesmos, porém cobertos das lamas do Dilúvio, desconfiados daquilo que pudesse vir de eras antanhas que foram depois nas enxurradas transcendentais de tudo que ficou lá no passado.

Nisso, avistamos, soberanas vezes, os minúsculos animais a percorrer trilhas antigas de só aparentes contradições, tecidas e cortejadas noites e dias, nessa transa do Destino. Queremos, outrossim, vicejar as alturas e percorrer a jornada dos eleitos. Porém falta-nos, ainda e então, abrir o sentimento e sustentá-lo no foco das virtudes. Quem não quer ser feliz?! Provável fosse, ser-se-ia logo, num instante sequer. Contudo, face aos laços da ilusão, quedados seguem tal caravana sem objetivo, nesse deserto das tradições seculares.

E tocar adiante significa, além de si, planos inevitáveis do quanto persistirá hoje e sempre. Segredar dentro da consciência a função essencial do encontro perpendicular das oportunidades. Sentir na pele o calor da esperança, cercados, pois, das dúvidas atrozes de tantas vidas suspensas em volta. Criar, sobremodo, o sentido das visões nas paisagens. Esse o vértice das histórias, princípio crucial do quanto existe. Vez em quando advém nas certezas o instinto de continuar, todavia sob o cerco das inquietações desses apegos vorazes neste chão.

Nos gestos de querer dotar as palavras de vontade própria, indagamos a razão de permanecer vagando pelos séculos e buscar a justificativa do que insiste permanecer lá longe nos recônditos da visão interior. Transmitimo-nos tais fagulhas de fogueiras inextinguíveis que alumiam a escuridão e vivem no íntimo das horas, resistindo aos apetites mais estranhos. Assim, feitos autores das vastidões, apenas respiramos o hálito de Deus e tocamos em frente o que nos resta fazer.  

sábado, 17 de maio de 2025

Noite obscura da alma

 

Esse tempo que se passa depois de saber que isto é ilusão. Tudo em volta vira uma prova a que vencer quando há disposição de chegar à real transformação. Na firme disposição de crescer espiritualmente, o mundo passa a significar um desafio constante. E disto advém o teste quanto esteja o ser a nível de exercitar o que compreendeu do verdadeiro conhecimento.

A expressão “Noite Escura” do poema de São João da Cruz se incorporou à doutrina espiritual como símbolo das experiências purgativas pelas quais os místicos devem passar até elevarem-se à perfeita união com Deus. Inspirado no Livro dos Cantares – no qual a esposa apaixonada sai de casa em plena noite à procura do seu Amado pelas ruas e praças de uma cidade adormecida –, o poema compara o anseio espiritual por Deus ao desejo de união conjugal. Para consumar o matrimônio místico com o seu Esposo, Cristo, ainda nesta vida, a alma precisa se desnudar do apego a si mesma e às criaturas, pois, segundo São João, “não se pode vir a esta união sem grande pureza, e essa pureza não se alcança sem grande desprendimento de todas as coisas criadas (Noite 2, 24)”. eBook Kindle

Nisto, qual exercício do aprendizado espiritual, vive-se essa fase de constatação do que aprendeu diante do contexto material e seus apegos. Numa desmistificação das vivências guardadas, o indivíduo busca agora encontrar a Si Mesmo no âmago da plena consciência, e nisto superar o transe do que constituiu a própria história, propondo um mergulho no abismo do mistério. Essa a ocasião de revisar o senso prático e buscar novos rumos ao aprendizado espiritual.

Mais que nunca, ao vencer as limitações do labirinto da vida física, só então avistar o Cristo íntimo de cada um, a testificar as palavras de Jesus, que nos disse: Vós sois deuses e não o sabeis. João 10:34

quinta-feira, 15 de maio de 2025

Nesgas de sol


Olhos acesos na face do firmamento, eis que descortinamos a paisagem do Infinito bem ao senso de compreender o que temos conosco da força dos destinos. Que dispomos da condição de oferecer ao dia novas certezas à medida em que esquecermos as limitações impostas pelos pensamentos horizontais. Numa faixa da consciência, bem ali, persistirão estes meios necessários de construir o que faremos de nós diante de tudo isto que ora percebemos e deixamos, vezes sem conta, escorrer na crosta do passado. Artesões de sorte inevitável trazida nos frutos do que virá, elaboramos, assim, o princípio do ser que somos à medida em que firmarmos os pés na claridade que nasce, todo tempo, fruto das raízes das existências. Isto de presenciar o discernimento e saber por em prática significa a realização da condição humana em toda plenitude.

Diversas vezes, no decorrer das horas, concretizamos as certezas necessárias do viver que plenifique e reja vida. Através do foco na realidade, distinguimos essa paz pelo conhecimento de que usufruímos a sabedoria do quanto nos traz até aqui.

Em tudo, pois, há pedaços vindo, dias e dias, dessa possibilidade soberana de ler novos momentos nascidos de cada pessoa. Conquanto mistérios aparentemente desconexos, formam um todo pleno das histórias e nelas leremos nossas vidas e suas consequências no trilho do que virá. São fragmentos postos em movimento às nossas mãos, com o que faremos, lá um tempo, o sonhado instante da revelação do sentido maior perante os céus.

As orações da Natureza sussurram em nossos corações toda verdade intuitiva de aperfeiçoar os resultados de sermos e estabelecer as bases da civilização de paz em que tanto sonhamos agora e sempre. A matéria prima disto já contêm os seres, dentre os quais os humanos.

quarta-feira, 14 de maio de 2025

Flores na estrada


Dias atrás, numa dessas ocasiões em que se aguarda pelos outros para cumprir os passos das rotinas, parado, avistei, diante de uma residência, a poucos metros, ramos floridos de papoula que se projetavam por sobre o muro. Daí, qual penetrando numa fresta da mente, me peguei a desenvolver algumas considerações pessoais conseqüências do que via.

Planta comum o ano todo, essa flor, a papoula, se multiplica com imensa facilidade, a colorir as ruas dentro de absoluta generosidade. Nisso, deslizei a pensar um pouco mais nas flores, em todas elas, nas flores inúmeras e variadas, espalhadas neste chão.

Coisa simples e fora de aparentes necessidades, uma flor de cujo arbusto não nascem frutos alegra a paisagem, tão só, num desafio à monotonia das cores, de causar admiração, revestindo o desenho vário e os formatos neutros dos muros e paredes de profusões e tons só comparáveis, no estilo, ao que promovem os também pouco prestigiados pássaros e borboletas.

Porém como a Natureza exerce perfeição num gesto máximo ao elaborá-los, dando, com isso, um banho de maestria ao produto final da beleza, realçada pela intensidade do Sol a cada manhã, cada tarde.

De cores inimitáveis, traços matemáticos, estética indiscutível, todas elas, as flores deste mundo, surgem inúteis, de presença fluida, expandem pólen e perfume, trabalham suaves e cumprem a missão do futuro nas asas do vento, dos pássaros e dos insetos.

Alegria em meio ao comboio dos homens práticos na ação da sobrevivência e do poder, ousadas, elas quebram, com a leveza da flexibilidade pura, os teoremas bizarros das tecnologias de resultados úteis, econômicos, financeiros. Lições insistentes, abrem suas pétalas ao sereno da noite e à luz da alvorada, quais gigantes desafiadores do pessimismo que insiste em querer toldar a paz social.

Depois daquela hora vaga de sentido, talvez comparável o sentido das flores, noto quanta promessa de amor elas reúnem, para sumir nas dobras do tempo, livres de luxo, aparato ou ostentação.

Seguia nesses raciocínios despretensiosos, quando recordei de um episódio lido a propósito da vida de madre Tereza de Calcutá. Certa ocasião, profissional da imprensa indagou sobre a relevância do que ela fazia pelos pobres e doentes da Índia, trabalho incansável e desinteressado, o que, segundo o jornalista, não passava, no entanto, de pouco ou nada, mera gota d’água perante o oceano imenso das tantas necessidades daquele povo.

Naquela hora, sem titubear, a freirinha respondeu: Sim, meu filho, mas sem essa gota d’água o oceano seria menor, palavras rápidas e profundas, de significado que, nesta hora, quero comparar à importância das flores em face dos mistérios infinitos da razão. Sem as flores, quanta gota d’água apenas anônima rolaria no desconhecido, a brilhar fora das vistas ansiosas, por vezes tristes, por vezes alegres, de todos nós, os viventes humanos!

terça-feira, 13 de maio de 2025

Saber quem somos


Isto o código único de permanecer nalgum ponto do Universo e viver qual sendo alguém. Olhar em volta e reconhecer as limitações das muitas respostas. Padecer do senso da ilusão, no entanto aceitar de bom grado tudo que antes esqueceram lá nas portas do Paraíso. E ficar inertes diante de luzes e instrumentos que os perseguem a todo alvorecer. As dores, as corres, o instante... Prodígios feitos de gente espelhada nesse antigo tabuleiro de miragens, nas vagas noites do desejo e demasiadas angústias de permanecer face a face com o mistério.

Quase isto, porém muitas vezes ausentes da realidade do definito que nos olha e, logo em seguida, desaparece num destino inatingível, lâminas afiadas do quanto até aqui se desenhou nas horas, contudo esparramando versões superficiais de tantos e quantos que viveram neste sítio solitário. Meras ilustrações de um livro de sonhos de algum impossível sonhador intensificam única vontade histórica, na continuação do que existe sob o Sol.

Nem de longe, pois, imaginar que somos esses os tais autores da reconstrução do Infinito. Sorrateiros, pisamos o solo da verdade, todavia ainda astutos e fantasmagóricos, querendo rever o plano original que irá constituir o que daqui seguir-se-á, entrementes. Muito do que visto pelas dobras dos horizontes nada oferece de certeza em termos da razão absoluta.

E tais fantasias em movimento nas curvas do Tempo, surgem pelas páginas dos velhos matutinos jogados ao passado, deixando tão só abismos nas consciências acesas. E depois...

As palavras sabem, mas sempre querem dizem doutro sentido de se voar em queda livre pelos abismos em volta, quais fragmentos de aventura das novas civilizações que virão a seguir, e apenas repetem o cerco das eras mais antigas. Com isso, cartas desfazem a cantilena dos sóis e oferecem justificativas desse ordenamento inesperado de hoje.

(Ilustração: Hieronymus Bosch).

domingo, 11 de maio de 2025

Os que iriam partir


Dalguma forma houve de ser assim. Registrava-se intenso movimento em torno de um guichê de tantos funcionários, enquanto vinham todos os demais à busca das fichas numeradas de cores azul e branco. Alguns vivos; outros, viventes, apenas. Todos eles, no entanto, atentos, recolhiam seus pertences e se dirigiam apressados a outras filas, na intenção dos próximos passos naquela construção monumental. 

Nisto, alguém lhe lembrava que não fizera sua inscrição e que, face a tanto, haveria de permanecer em terra até mais adiante. No entanto já sabia disso, porquanto estava escalado a outra missão ainda no solo, ora em andamento, a razão de continuar aqui.

No meio daquela azáfama, uns previstos a seguir e outros, só uns poucos, de ficar, o sonho continuaria noutros setores, vista a urgência de cuidar dos segmentos. Mesmo desse modo haver-se-ia de saber das tantas naves que ora preenchiam o firmamento, que viajavam transportando levas sucessivas. Dentro de todas, as provisões; as notícias confirmavam a sequência natural de tudo aquilo, então.

...

Momentos vagos aqueles; importava, agora, compreender a exigência das missões de repovoamento dessas outras pátrias no vácuo dos infinitos, porquanto permaneceriam bem poucos a desenvolver sistemas de comunicação entre os que daqui foram e os que permanecessem. Olhos fixos nesses roteiros, algo qual organização praticamente perfeita cuidaria do quanto seguir-se-ia daí à frente.

Isso a significar, pois, o aprendizado da compreensão. No rastro disso, pouco tempo que fosse e tudo viraria mero contexto de criaturas a cuidar das funções essenciais que ficassem. Somente os que seguissem contariam a história desse passado, dimensões e dimensões, relatórios e relatórios, lançados no espaço a quem quisesse, talvez, desvendar princípios originais. Aquilo deixado no sonho traria o roteiro das próximas estações orbitais que encontrassem pelo caminho.

(Ilustração: Gravidade, de Alfonso Cuarón).

sábado, 10 de maio de 2025

Si libertar de mim


E acreditar que possível seja. Refazer o percurso natural do mistério que vive nas brenhas da alma a bater nas paredes do desejo qual quem jamais imagina vagar nesse mar sem fim, e navega, no entanto. Isso, feito outro que vivencia inventar, desvendar o uso dos instrumentos dagora. Transpirar consciência e amar afetuosamente. Tal personagem que habita aqui entre as palavras, tanger o fôlego constante do Tempo através dos sentidos, da paciência, ente imaginário feito de ondas sucessivas a estirar pensamentos nas estradas, por vezes solitário nas ausências e feliz na presença. Algo constante, porém afeito sentir os sonhos que tocam os sentimentos.

Saber, lá em um momento quando portas reais abrir-se-ão, das certezas verdadeiras, pagos que foram compromissos antigos. Há, sim, tal ocasião. Tudo em volta diz e traz alimentos. Das longas esperas, o vento forte de libertação, de coração a coração. Dar de si o sentido precioso da presença a quem deveras o mereça.

Os personagens em cena declaram, à viva voz, o senso doutras veracidades vindas desde longe, de onde havia esperança e fé. De mundos audazes, lugares tangidos na imensidão, acesos, porém, no íntimo das criaturas humanas. Sabores novos, definitivos, ricos de melodia, na concretude da música perene existente no ser em si, na essência da gente. Uma renovação em tudo quanto existe e existirá sempre. Nós, viventes dos céus e senhores do futuro.

Esse encontro far-se-á na inspiração de todas as cores e formas espalhadas pelas epopeias infinitas de um agora constante. Desvendar a necessidade da paz e exercitar o compromisso do Eterno que sobrevive e mantém o crivo da razão. Saber da própria intuição, nos detalhes desse quadro imenso das horas a que damos sabedoria nos mínimos detalhes de nós mesmos. Alegrar os dias. Recriar as existências. Amar, antes e depois.

sexta-feira, 9 de maio de 2025

Os escravos do Destino


Até você se tornar consciente, o inconsciente irá dirigir sua vida e você vai chamar isso de destino. Carl Jung

Eles vieram assim de uma hora a outra. Chegaram assustados com tanto ruído de máquinas em formação de guerra, mas, logo depois, se satisfizeram em apertar os gatilhos e ver a destruição que causavam naquele mundo aparentemente novo onde aportaram. E vieram surgindo por detrás das montanhas, ocupando as vilas, as cidades, morando debaixo de pontes, viadutos, que foram encontrando pela frente.

Passados que foram alguns milênios, após plantarem as ditas civilizações clássicas, quase de imediato desvendaram lá um jeito de também preencher os espaços dos céus em volta, que denominaram espaço aéreo. Dominavam tudo que fosse, só não o instinto de posse e os confrontos, aprendidos bem nos inícios. Viveram em série, submetidos aos mesmos valores que trouxeram de ninguém sabe onde.

Em breve sabiam de cor todas as letras de música, o roteiro dos filmes e dos romances mais conhecidos, as regras dos jogos donde aprendiam a enganar uns aos outros, os códigos secretos e as litanias com que hipnotizam a si, aos animais e as plantas. Do que gostavam intensamente, das noitadas zoadentas, das mesas fartas de bebidas inebriantes, das sustâncias estupefacientes, dos colchões plastificados, das viagens ditas internacionais em volta das demais, nas horas dos espetáculos esfuziantes de praças e ruas, e nisso espalhavam lendas e violência mil.

A pensar com clareza, eles persistiram a transitar nos becos e nas ruas, avenidas, autoestradas, agora já munidos de outros instrumentos também metálicos, agressivos e velozes, montados nos escombros daqueles originais, vistos desde o princípio. Raros reconhecem as próprias paixões e habitam velhas palafitas, nas estruturas de restos abandonados ainda trazidos naquelas primeiras naves ainda depositadas nos museus e cidades subterrâneas, vez em quando descobertos embaixo das superfícies inúteis que puderam criar.

Enquanto isto, prosseguem a construir o que depois destruirão nos impulsos agressivos até então monitorados pelos novos dispositivos espalhados em lugares os menos imaginados. Admiram-se do que produzem e dormem sonos esquisitos, de que, ao despertar, lembram ouvir vozes distantes, daquele tempo das eras outras perdidas na imensidão do Infinito.

(Ilustração solicitada do ChatGPT).

quarta-feira, 7 de maio de 2025

Interpretações


Desejo maior não conhecera até então; desvendar os segredos das profecias tornara-se, pois, qual instinto de sobrevivência naquele mundo que houvesse de vir. Mesmo assim, tendia guardar o excesso de dúvidas diante das quantas previsões dos livros, tradições populares, avisos de sonhos, etc.

Ainda que desse jeito, avistava um tanto de verdade no que diziam os videntes. Qual o quê, buscava reafirmar situações trazidas pelos jornais, vídeos de celular, livrões empoeirados das poucas bibliotecas onde estivera. Dentre eles, aquele que conservava consigo e que insistia de repassar, quando em vez, principalmente nos capítulos do Apocalipse, de João, ali repousado na mesa próxima à cama em que buscava refazer os ânimos.

Sei bem, não, se entre dormindo e acordado, o que avistaria mexera lá dentro de seu espírito, no meio daquela noite, algo qual riscos no céu e ruídos fortes de movimentação a bem dizer do trotar de cavalos. Nisso, pé ante pé, chegou próximo da janela e quis ver além da escuridão daquele lugar afastado onde morava.

Nada notando, mesmo que fosse persistente, insistiu de escutar ruídos nas hostes do firmamento, efeitos, por certo, dalgum acontecido esquisito no vão sombrio daquele instante. Um rasgar de véus estraçalhava o silêncio, quem sabe?, de fenômenos desconhecidos nascidos da sua imaginação.

Nessa ocasião, buscou as lembranças do tanto que reunira de interpretações e que haveriam de vir em futuro nem tão distante. Argumentou no íntimo, e tratou de se acalmar. Quis rezar, mas as frases do Pai Nosso demoravam a preencher as emoções desencontradas. Na luz fosca do cômodo, avistava o livro grande e suas páginas abertas no trecho que lera pouco antes de pegar no sono. À claridade da vela já quase gasta, pode delinear, dentre outros versículos, um que lhe tocava com mais intensidade: E, havendo o Cordeiro aberto um dos selos, olhei, e ouvi um dos quatro animais, que dizia como em voz de trovão: Vem, e vê. Apocalipse 6:1

segunda-feira, 5 de maio de 2025

Esse outro Eu


Há um ser que nos preenche o espaço entre as palavras, o silêncio. Um ser, algum ser. Tal personagem vivencia consigo próprio, e observa constantemente o jogo de montar donde nascem os significados em volta. Ser próximo e distante, talvez desconhecido de muitos. Alguém constante, a formar numa tiragem única dos pensamentos as folhas do Tempo. Espécie esquisita das presenças, segue o instinto de procurar o jeito ideal de chegar aos sentimentos. De hora em hora, numa sequência inesgotável, ali transitam em imagens feitas no desejo de revelar a si o que seja pertencer aos lugares, estar aqui, qual seja isto, porém.

Pessoa a pessoa, se veem, se deparam num processo de ajustamento da ordem até então desconhecida de ambos. Mas saber que não podem parar a qualquer dia, sob pena de esquecer nalgum ponto do Universo aquele eu que traz consigo desde quando existe. Isso equivale a um sistema de crenças, de códigos verbais, de tradições ancestrais, lendas, procissões, mitos vários que plugam no vento, nas emoções guardadas lá de antes, nos instantes de solidão, notícias, inquietações, filmes, livros, filosofias, pedaços de sonhos, interpretações musicais, tudo, enfim, que compõe essa dimensão de existir perante os desaparecimentos corrosivos. Sustentar, pois, esse ator inevitável que seja, equivale continuar diante das vastidões e dos desafios.

Nisto, impera um poder substancial perene quem consta nalguns sinais enquanto acontecem os fenômenos em volta. São comboios sucessivos de marcas determinantes, que sussurram a continuidade entrelaçada em tudo o que haja. Nesse transe de conhecer e escutar o silêncio, bem evidente as nuvens de palavras formam o alimento dos dias, na ânsia absurda de mourejar pelo mundo à canta do Destino.

As lembranças, os valores, atitudes, circulam à toa no vazio, no entanto presos ao chão das histórias que tantos contam, a cruzar os ares, e permanecer inexistentes logo em seguida. Não fosse, por isso, as palavras, viver tornar-se-ia, por demais, uma missão de dúvidas e ausências de quase nenhuma existência, impossível de ser.

sábado, 3 de maio de 2025

Pedro Maia


Das maiores invenções do gênio humano, o automóvel chegou ao Cariri, em Crato, no ano de 1918, com o primeiro exemplar sendo aqui trazido pelo comerciante pernambucano Siqueira Campos, estabelecido na cidade e que, depois, lhe emprestaria nome à sua principal praça.

Nesse logradouro, viriam adiante se instalar os carros de aluguel, conduzidos por personagens famosas da hirtelândia, Audísio Briseno, Maru, Lasquinha, Menezes, Urubu, Manoel Pachola, Pedro Maia, dentre outros.

Esse, Pedro Maia, ganharia prestígio por conta do Ford modelo 1929, sedam conversível, de sua propriedade que permaneceu longa fase no serviço da população local, característico dos períodos áureos dos transportes individuais de aluguel.

Dentre as proezas do tradicional chofer de praça consta haver transportado Dr. Otacílio Macedo, médico e jornalista cratense, até Juazeiro do Norte, em 1926, para fotografar Lampião, na célebre visita ao Padre Cícero, pois além de motorista, Pedro era fotógrafo, profissão que desempenhou com talento.

Um dos retratos que, naquela oportunidade, tirou do bandoleiro das terras nordestinas tornou-se famoso, ilustração de capa de inúmeros livros a propósito dos desmandos por ele praticados, no meio desses o do brasilianista americano Billy Chadler, de sucessivas edições, tendo a assinatura de Maia no rodapé da fotografia.

Certa feita, em 1977, ao lado de Antônio Vicelmo, entrevistei Pedro Maia para o jornal Tribuna do Ceará, de Fortaleza, matéria intitulada Fotografou Lampião e só agora narra a façanha, detalhando a tal aventura. Integrava uma série de entrevistas idealizadas para a criação do Museu da Imagem e do Som do Instituto Cultural do Cariri, projeto original de Dr. Jefferson Albuquerque, então seu Presidente, o que não chegou a efetivar.

Pedro Maia conduziu passageiros e ganhou prestígio, sobretudo devido ao trato característico como atendia os clientes, pessoa afável e bem humorada. Lembro quando, já na década de 60, alunos do Colégio Diocesano, em horários de recreio e a título de peraltice, pegavam corridas no velho automóvel, para evidenciar seu estilo arcaico diante das alunas do Colégio Santa Teresa, airosas representantes da elite citadina.

Nessa fase, indagado quanto às especificações originais do veículo, então ultrapassado pelas tecnologias inovadoras da moderna indústria, Pedro Maia respondeu:

- Mexi tanto nesse carro que até esqueci a marca – e desconsolado balançava a cabeça, a mostrar a ação inexorável do tempo, acrescentando: - Ele hoje tem peça até de moinho.

Aqui e acolá


O querer do pensamento nos leva aonde deseja, independente da nossa vontade. Arrasta-nos de um jeito aleatório, pondo no coração as emoções dos lugares em que pretenda. Escolas religiosas insistem na alternativa do autodomínio, o que pede concentração. Quase uma máquina desgovernada, ou governada de modo imprevisível, vemo-nos presas desse instrumento que é nosso, no entanto ainda carente de domínio, o pensamento.

Nisso, a gente se procura feito andarilho em mundos desconhecidos, sabendo ser levado a eito no jogo de existir, submissos a nós mesmos, quem sabe? a um eu provisório. Depois dos acontecimentos, alguns saem à busca da origem daquilo tudo, porém longe das reais identificações do seu autor. Vagantes cativos desse equipamento que transportamos dentro de si, sobrevivemos a duras penas às consequências dos seus atos por vezes contraditórios.

Em contrapartida, as escolas orientais, sobremodo, indicam esforços de reconhecer meios outros de equilibrar nossas escolhas, inclusive nessa hora de usar a máquina das ideias em ação. Também dar-se conta de escolas ocidentais que indicam a função de estabelecer novos padrões mentais, até chegar ao senso do Eu Verdadeiro, o Self, possibilidade evolutiva e libertadora da mera determinação do ego, este identificado com o pensamento a ponto de fazê-lo, quando entregue à própria sorte, o vilão da consciência.

Perante as movimentações mentais, eis que nos deparamos entre a Sombra e a Luz, territórios sob os quais exercitamos a sequência dos passos. Bem de acordo com a prática do que ora necessitamos em termos de aprimoramento espiritual, cabe a todos distinguir aspectos outros na transformação interior. Essa faixa transitória da matéria ao espírito significa o ser em si (nem tanto à terra, nem tanto ao mar), restando, pois, ao princípio espiritual que o somos exercitar a sua percepção e desvendar o mistério de viver consciente.

(Ilustração: Yin/Yang).

sexta-feira, 2 de maio de 2025

O rio do Tempo

Matriz das existências, nele o que se lança há de colher, sem qualquer dúvida. Seara por demais indescritível, oferece os adornos às sombras, outrossim delas, que andam cheias de calor e ilusões, nascem as flores e rebentam os frutos. Nem de longe que doutro jeito acontecesse, todavia marcas, cicatrizes, filamentos, cores, ficam entranhadas no vazio, deixando rastro profundo de objetos esquecidos pelas suas margens, desde sempre determinantes a que venham, dias e dias, a desaparecer pelas curvas longas do passado. Dentro, bem no íntimo das almas, dali o descortínio do mistério, ente este daqui do Chão, porém distante das compreensões e das escolhas. Senão, sempre, quase que nunca existirão as evidências que sejam doutras hostes além das puras ficções, do quanto prósperas foram. Símbolos. Notícias. Equipamentos. Desejos dos mares abertos que os alimentassem o furor.  

Astuto, carismático, ele desce a ermo no mesmo rasgão esquecido das estradas de antes. Viaja a pano solto pelas vidas afora. Desperta, vez em quando, face a face nos estios. Creio até que sofra, no entanto pouco demonstra que signifiquem gestos de certeza. Um fôlego a percorrer as ruas na carne das pessoas. Nisto, em volta, as paredes, os carros, contam as histórias mil em movimento. Dos infinitos, olhos observam o instante e aceitam ditames estabelecidos lá de longe, nas várzeas escuras.

Dúzias de interrogações transitam nesse mesmo espaço de depois, quais fragmentos de transes inexplorados. De algum lugar vem isso que aguarda todos, seja lá o que seja, contudo. Buscas abissais dos séculos de criaturas a transportar sofreguidão e retiros; sabem-se, enfim.

Pessoas, dramas, indagações. Luzes. Amores. Vontades absortas. Palavras. Instintos. Músicas. Livros. Filmes. Sonhos. Ausências.

quinta-feira, 1 de maio de 2025

Andanças


Tais diante de um espelho onde o passado busca encontrar esse outro eu que não existe mais, espectros de si mesmos rodam, bem ali, o mistério de depois. Na ânsia de dominar o que há de vir, isto resume um todo que nem agora continua. Ser-se-á fantasmas de quem mergulhou nos pensamentos e desapareceu em seguida, quais ausências em atividade na crosta da imaginação. Isto de avaliar, desde sempre tem alguma razão de permanecer onde nunca esteve. Eis a fonte dos desejos, propensão de ocupar o palco de um circo definito que habita o íntimo das criaturas humanas. Esse o mito do que virá, no entanto andam em quadras livres pelos sóis que se renovam neste universo das relatividades.

Contudo, pouco a pouco deixamos cair a máscara do anonimato e sumimos de vez pelas profundezas do inevitável. Repastos do Tempo, sustentamos, quantas e diversas vezes, vidas afora, o delírio das possibilidades, e nisso preenchemos diversos papeis já triturados pela fama das multidões enfurecidas. Esquecidos do que somos, apenas ocupamos trajes rotos e casas abandonadas. Assim, tangemos comboios sucessivos através da solidão, um a um lívidos e apáticos da essência verdadeira que nos trouxe até então. Lúcidos, por vezes, todavia amorfos e parceiros do esquecimento.

Destarte, hoje avistamos o vazio das ilusões e as deixamos escorrer entre os dedos, restos ressequidos das oportunidades jogadas fora. Achar-se, descobrir o senso da compreensão e atirar, de corpo inteiro, a alma aos sons metálicos das horas. Invadir os séculos de antigamente, a degustar, de novo, o sabor da inocência, feitos meros instrumentos de uma realidade adormecida no coração da gente. Quantos sonhos, farnéis e deslumbramentos, postos de lado passadas que foram as versões originais criadas na euforia ou na angústia. Conquanto servidores fiéis da dúvida, sós e afoitos nos abandonamos de tudo aos conceitos acumulados, talvez ainda descrentes da verdadeira consciência.

(Ilustração: Amaringo).