domingo, 29 de junho de 2025

Numa música suave


Quem ama desses amores de não ter tamanho e sente o peito crepitar da mais ardente fogueira, espécie de dor e prazer sem conta, de que se quer fugir, porém recusa por conta das dimensões do mistério a envolver tudo em volta, a esses resta a pergunta descomunal de quando se reunirá em definitivo com a pessoa amada, querendo ser único ente pelos milhões de anos eternos do depois, e jamais sair de perto um do outro. Essa pergunta, certo dia esses personagens responderam com o amor definitivo... Num conto de consequência permanente, despertaram nos braços da fusão dos seres, amálgama das individualidades, esperança dos que aspiram a constância do maior dos sentimentos.

Depois de uma noite chuvosa do mês de junho com neblinado constante por seguidas horas, veio nascer sol radiante, a iluminar as planuras do mundo. No peito, corações doridos, mas felizes...

Contudo, alta madrugada, o frio sorrateiro tudo envolveu, singrando mares, sinais da pura felicidade cantada gerações adentro. A movimentação do sono os acorda, enriquecendo a paisagem da alma de nutrir o universo interior. Aonde olhar, marcas de passos na superfície macia dos corações trepidantes.

...

Enquanto pessoas chegavam para participar do colóquio, ele organizou os pensamentos das lembranças da noite. Seus olhos ainda queimados de sono a deixaram dormindo, linda, na mesma cama dos abraços dadivosos.

Saíra e levara consigo saudades sacudidas ao vento da manhã a circular pelo pescoço, no rosto, nos cabelos, ao dia claro, e características semelhantes aos amores mais vivos, na beleza da virtude sertaneja.

Afinal passaram dias pródigos de apreensões. A noite representara a cicatrização das feridas antes abertas e pegajosas. Ele preservou na memória o traço escultural das curvas do seu corpo que há pouco afagara, cheiroso, leve, brisa bailando no desenho das nuvens, na festiva manhã.

O dia amanhecera, pois, com imagem dela a se superpor na consciência, através da luz refulgindo em milhões de pedacinhos espalhados na estrada. E quando o espaço reuniu o tempo num só beijo indivisível foi que notou as impressões da noite no dia especial no formato de flores, soma das duas metades em completude absoluta, para sempre num só ser assim.

Heróis de fancaria


Isso desses acontecimentos que se desfazem no tempo, tais nuvens a mover no vento e desaparecer sem deixar vestígios. Lembram também as versões das histórias ao sabor de quem as conta. De hora a outra e o que foi some pelas prateleiras dos momentos, ídolos a serviço de fregueses, a conversar e nunca mais que sejam. As placas das ruas e praças registram tantos desses exemplos que nem de longe haver-se-á de reviver aquilo que nunca fora jamais.

Bom, mesmo assim preenchem o território vazio dos contentes, entre os sentimentos e as palavras, narrativas adversas somadas aos interesses em jogo. A gente para feito quem indaga dalgum vidente aonde foi ficar a verdade daquilo, se é que houve ou não. Enquanto isto, os vasos andam cheios de votos, de discursos, litanias e páginas e páginas repletas de fantasias, o que obriga o grande público a deglutir enredos sucessivos de longas peças vendidas a preço de comércio das consciências dispersas.

São prêmios vários o que anunciam os arquivos da inutilidade, enquanto multidões adormecem sob contos arrevesados. As tais lideranças deste mundo exercitam esse comportamento.

Nisto, os ruídos desformes enchem os pergaminhos da Civilização. As epopeias significam esse limite do Universo até então desconhecido, porém. Qual viver um ensaio, ler rascunhos imaginários, olhar poentes artificiais, exercitar códigos imprestáveis, quaisquer explicações padecem o furor da imperfeição. Por demais, nalgum lugar há de haver coerência, justiça plena, contudo.

Na escrita dos destinos humanos sobrevivem os credos, as filosofias, as intenções, todavia cercados de interrogações e dúvidas. Aqueles senhores da Ciência, dos governos, sabem disso. Aceitam, outrossim, sustentar o coro dos contentes e aguardar, olhos acesos, a pauta dos sentidos. Intervalos de súplicas e esperança prevalecem vez em quando no silêncio das gerações, sempre atentas ao segredo que sustenta os corações fieis.

(Ilustração: Jardim das delícias terrenas, de Ieronymus Bosch).

sábado, 28 de junho de 2025

É o tempo de transcender


Na sequência regular das estações, chegamos ao tempo de transcender umas coordenadas que pareciam sólidas na ordem dos acontecimentos. Mesmo  certos de que sempre ver-se-ão pessoas tristes, laçadas na teia rotineira do Sistema, também haveremos de anotar a firmeza dos que usam outra linguagem menos cômoda, para exigir coragem de mudança, própria à renovação dos valores em busca de perspectivas. Logo, fartos blocos se sucedem nesse proceder e um vórtice de propostas salutares crescerá, modificando o quadro geral de incoerência que domina os espaços vivos da sociedade, na Terra, obrigando-nos a reverter em pesadelos nossos melhores sonhos de uma história plena de Luz Superior, o que, como nunca antes, vislumbra meta principal do fluir humano. Tanta possibilidade alimenta os mais diversos setores sociais, desde que se observe com olhos afeitos a análises abrangentes, quanto ao desejo de muitos em querer paz coletiva sob os signos de trabalho e progresso.  A felicidade jamais se apresentou tão ao alcance de ambos os blocos de poder. Não tencionamos negar, entretanto, a parcela dos riscos, da imperícia, por ser parte normal das engrenagens, o curinga  fantasmagórico, o vilão ameaçador. Contudo, daí a carência das ofertas limpas para quem se disponha construir um mundo restaurado, onde seres vivam a justa dignidade.

Por certo, tendência dos que procuram algo confiável, vem a dúvida: Em sendo assim, qual a garantia de não vivermos outra fase que prenuncia grandes desatinos, semelhante recentes passados, em meio aos fossos abertos de gerações ainda traumatizadas, corpos revirados no monturo?

Perigo de ver existe, pois falamos há pouco da margem inelutável de erro. Todavia o valor maior prevalecerá, ainda que venha disso acontecer. Seria o caso de fundir os pedaços no reinício tempestivo de nova caminhada.

Essa, porém, não será a hipótese de nossa preferência. Mesmo porque temos agido no sentido de alterar pressentimentos negativos, outra vez perniciosos ao jogo de escuro e claro que merecemos jogar após tantas desastrosas tentativas. Chegou a época das fixações definitivas do estágio para o qual nós, alimárias inteligentes, os Espíritos,  aqui viémos. Dentro dessa ótica, insistir na timidez quer nos parecer mera obstinação irresponsável, destituída de quaisquer atributos racionalistas, depois das inúmeras frustrações descabidas e lágrimas quentes.

E os jovens sabem disto quando desejam ser felizes. Ninguém falha sabendo acertar. A inconsciência oferece a lição de seu mesmo descrédito, afastando, por declividade, todos os que buscam as modalidades corretas de proceder.

Queremos contribuir, desta forma, com o pensamento fiel de que  tempo equilibrado virá, constante e bom, no seio amigo  do Planeta, adotado pelas mentes que passem a gerir instituições. Essa coisa de que não tem mais jeito faz parte das ideologia a divulga com persistência, para engano dos crédulos, nas orquestrações comprometidas. Fugir incólume desse canto mercenário cabe a cada um, atitude sábia dos que queiram resistir aos embates de furacão impiedoso.

Grande pugna se prenuncia através de conflito insano dentro de nós mesmos, entre os vícios e a virtude. A suspeita desse mapa cinza nos foi entregue após explicações filosóficas por vezes digeridas com pressa ou lerdeza. Uma sentença crítica agora tornou-se golpe de oportunidade. Chega-se ao grau em que  separar  o errado e o certo virou cesta básica, no comércio das variações culturais.

A parafernália tecnológica abrangia, por isso, função de reunir os elementos desse mercado impessoal; a eletrônica trouxe a quem descobrir todo seu aparato eficaz de qualificar mensagens desencontradas, cabendo saber o proveito máximo obtido, salvando-se de ossos, pedras e espinhos, expostos para alimentar um futuro que é de todos.

Quais normas de salvamento, na floresta íntima do Ser, ficam nestas ideias esboços que bem poderão acalentar  a unidade no meio dos rastos brilhantes, caminho eterno da realização espiritual.

 

                                               01.06.95.          

sexta-feira, 27 de junho de 2025

Visagens ao meio-dia


Ali defronte, volta e meia elas reaparecem. Nem bem o Sol queira esquentar ainda mais, elas resolvem mirar o tempo numa audácia sem cerimônia. Atiçam o fogo da discorda entre povos, entre pessoas, entre irmãos; resolvem distinguir do erro os desejos, e denotam farpas aos botijões, gastando, assim, o estoque de armamentos fabricados pelas gerações inteiras. Ao que supor, significam isso defeitos ainda constantes nas almas das criaturas humanas.

É desses instintos atrasados que a raça precisa se livrar, sabem lá quando, porém. Tantos, demasiados, que minam a resistência dos mais fortes e definem os acontecimentos. Daí as práticas que prevalecem, os vícios, as ganâncias, os estragos. Espécies rústicas de si mesmos, revertem previsões positivas e transferem as outros no que lhes caberia vencer, sobremodo. Desde quando tal tem sido, há que rever a História.

Enquanto isto, aí estão os monumentos aos heróis que encheram as ruas e praças com seus nomes inesquecíveis. Deixaram nas legendas os feitos magistrais, resultados hoje encobertos pela poeira do Tempo. Mas são eles essas quais visagens a percorrer os sentidos do que resta. Empalidecidos no chão das práticas correntes, só tremeluzem face a face consigo próprios, talvez.

Um naco de civilização contudo persiste vidas a fio, nos instantes de aflição dos que venceram o mundo. Reagem pais, mães, irmãos, filhos, ao ver partir aos campos de luta suas sementes atiradas ao vento. Susto de que vivem todos, guarda cálidos sentimentos e dormem ao seio das famílias. Isso numa fase em que o absurdo compõe o quadro das existências, as surpresas, os imprevisíveis, e enchem os universos de números escandalosos de dores e respostas à esperança dos bilhões espalhados ao relento da sorte.

Bom, quero crer no suficiente dessas palavras, delas não ser nada além do roteiro das imagens que vagam soltas nos meios eletrônicos, de mão em mão, entes que ora somos, alimentados de visões nos quintais desse Planeta macerado, dos parceiros de um jogo até então desconhecido.

(Ilustração: Cristo perante Pilatos, de um seguidor de Hieronymus Bosch).

quinta-feira, 26 de junho de 2025

Imagens do desconhecido


Os sonhos insistem dizer isso, contar histórias nunca vistas e vividas, no entanto distribuídas nos versos das canções, na estampa das roupas e nos desenhos que as nuvens desenham lá nos céus. Soubéssemos descrever, narrar, sentir o que despeja o imaginário e, por certo, jamais haveria necessidade do tanto de produções que impera. Haver-se-ia de sentir nas quebradas de noites e noites o império do Tempo, que domina as criaturas humanas e o restante de tudo. Entre lágrimas e risos, passearíamos no sem fim no trem da imaginação e, por vezes, fugiríamos de si quais circunstâncias ocasionais invés das gentes que ora somos.

Isto, contudo, domina o seguimento do que existe e preenche de segredos os passados mais antigos. Daí escreverem, estudarem, realimentarem gerações inteiras das mil filosofias e dos credos, a percorrer o espaço dos sentidos, fazendo-o mero enredo das horas desses tempos atuais. Espécie de instinto inevitável, a todos ressurge o desejo insano de contar das próprias narrativas as interpretações fartas daquilo que nem foi e jamais, quantas e tantas.

Essa tela infinita, pois, dos pensamentos em movimento faz das existências alimárias vagando no deserto imenso dos nossos pés. Exige noções do que quer que seja, contanto desenhem as estruturas que não passam de um senso de eternidade muito mais criado por nós do que, aparentes em realidade, assim pudessem haver sido. Disso, as inúmeras tradições acumuladas nas bibliotecas monumentais, guardadas a sete chaves em milenários edifícios.

A meio da vontade e das liberdades inquietas, esvai o firmamento através dos olhos desses autores, um a um desfiando no calendário das circunstâncias e fabricando nas almas fantasias surreais. Nessa tira estreita de pensamentos e sentimentos, substantivos e adjetivos, as conjunções, interjeições e os verbos elaboram meticulosamente o futuro. E nessas horas, formam o rio das ciências, resistem aos heróis e adormecem nos séculos impávidos. A braços com nós mesmos, destarte, transitamos pela mar da consciências, estruturas que constroem de símbolos a Verdade e a Luz das nossas vidas.

(Ilustração: Pessoa à janela, de Salvador Dali).

quarta-feira, 25 de junho de 2025

4.732


Sempre que retornava, ali estava ele, 4.732, a lhe esperar de braços abertos, às vezes com um buquê de rosas amarelas escondido atrás das costas, para logo explodir num riso franco, a mostrar todos os dentes, enquanto passava o outro braço pela sua cintura feliz, altaneira. Um par perfeito, ela e 4.732. Ninguém de consciência em ordem acrescentaria qualquer mácula àquele relacionamento de promissão.

Viajasse, jamais 4.732 deixaria de mandar-lhe mensagens variadas nos meios ao dispor, épocas eletrônicas digitais, fossem de transatlânticos, aeroportos, “shoppings”, livrarias... Importava que não lhe restasse esquecido o contato de sonhos que alimentavam qual raça de bicho em extinção, amor de almanaque que vivia às 24 horas, nos tempos de ecologia militante dessa fase da civilização, chovesse ou fizesse sol, razão primeira de várias existências juntos.

Numa dessas andanças por esse mundo, atravessou pelo juízo de 4.732, tipo de bólido intruso, pesadelo doloroso, quando, em lampejo onírico, simulou-se um retorno sem a presença de um deles dois, que ela houvesse buscado por ele sem achar, frustração de não ter mais tamanho, contudo fora de quaisquer cogitações, porquanto alimentavam durasse a relação infinitos mundos e séculos eternais.

Depois daquilo, precedente funesto de haverem perdido contato ainda que em sonho, 4.732 desconfiou que algo de anormal pudesse conspirar, quem sabe para desaguar num dia comum?, a ocorrer no fluir das tantas reencarnações por eles já vivenciadas com êxito pleno, a ponto de nutrirem a certeza certa de um par perene.

O pensamento plasma acontecimentos quando fixado na intensidade suficiente. Mas não se pretende considerar que essa realidade visse pelo pensamento. No entanto, belo dia de verão, sol aberto, céu claro de poucas nuvens, brisa quente no rosto suado, ela chega em casa após dia de trabalho intenso. Baixou os pacotes sobre a mesa da sala de jantar, passou a vista pelos diversos cômodos, e nada que denunciasse a presença constante de 4.732, caso permanecesse na cidade.

- Beeheeem!!!!?????... Beeeeeheeeeem?...

Estirou o longo pescoço de dama distinta aos quatro cantos do quintal, e um vazio dolorido de quando a pessoa amada se ausenta sem deixar vestígios além do augúrio da saudade a perfurar vertigem na barriga dos medos abandonados antes de encontrar a pessoa amada, esperança boa. Nenhuma vivalma fez o gesto de entrar no palco do instante.

Ela viu-se preocupada ao notar primeiros sinais de impaciência aparecendo por baixo dos lençóis frios da cama por fazer da manhãzinha, na pressa de sair para o trabalho. Esquecera de fechar a janela, nem perguntara a 4.732 quanto ainda permaneceria em casa antes dos compromissos vespertinos.

Desceu a escada sinuosa rumo ao porão. Nisso percebeu as lágrimas rasgando caminhos do peito através dos olhos ressecados e descer rugas abaixo que lhe habitava o rosto, nos trilhos laterais do nariz, preço que pagava por dormir pressionando a face contra o travesseiro cheio de ervas do campo.

Na solidão invasora que chegava de surpresa, apenas conseguiu recolher as roupas secas do varal, antevéspera de chuva ligeira que lhe misturava o choro, na fisionomia lamacenta dos derradeiros resquícios de maquiagem improvisada no escuro da madrugada. As réstias escassas de luz trouxeram ao espelho as marcas finais das lembranças que para ela agora retornavam de longe, visão preciosa de 4.732 a puxar uma mala pelo galpão da rodoviária barulhenta, despedida suave e silenciosa dos dois, sós, sob o testemunho deles absortos.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

A estrada nos próprios pés


Ao longe, sons de trovão. Ecos sem fim dos espasmos do quanto existiu e agora pouco significa diante das injustiças guardadas debaixo de sete capas. Bem isto, um final de tempos em formado maior, espécie de sórdidos arremates do que se deixou à margem do Destino. Pequenos seres que são, resolveram transformar nada em coisa nenhuma a todo custo. Fruto disso, a História prossegue, inscrita nas pedras e desfeita no senso comum das criaturas errantes. Muito disso que aí esteja fica na conta da exatidão matemática dos enredos praticados vidas afora.

Nem perguntar tem a quem, conquanto os atores só perfazem a cena nos atos que sucedem todo tempo. A tela dos acontecimentos reza isto, do resultado das mil e um noites exercidas a todo gosto diante do Eterno. Máquinas em profusão, que ganham as ruas, aumentam a velocidade num abrir e fechar de olhos. A tal Civilização requer nitidez naquilo que produz e negocia nos mercados de carne do Planeta. Mais quiséssemos e ficaríamos à margem dos pensamentos. De nada importa aceitar ou não, porquanto o pacote chega pronto via internet.

As palavras falam e os ouvidos esquecem. Deixam, solícitos, seus dejetos nos parques e vilas, indiferentes, pois, ao instinto da sobrevivência coletiva. Pardacentos seres percorrem as florestas de metal, atentos ao desfecho dos projetos humanos. Eis os dias, horas sem limites. Nisto, a peleja fica na razão direta dos desejos, porém.

Meros autores de si sacodem os lenços à busca das respostas que longe estejam da realidade possível, dados os meios utilizados, numa prática ferina. Algozes pessoais, tangem rebanhos pelas florestas do vazio, quais senhores das histórias inexistentes.

Mesmo assim, de certeza haverá coerência ao final de tudo. Enquanto deslizam os exércitos das ausências, persistirá o critério doutros valores em ação no trono das alturas, por vezes até fora das tantas vistas ansiadas.

domingo, 22 de junho de 2025

Ser possível


Egressos da inconsciência, os vultos das caravanas tão só alimentam o sonho a que vieram. Tocam as paredes de imenso túnel e veem no quando adormecem, vezes sem conta, nas águas escuras, ainda indóceis, dos céus. Eles assim ultrapassam a barreira da ausência e padecem os ranços da solidão. No entanto, tudo dentro do imaginário do possível. Apenas faces da mesma moeda do Infinito, estranhos a si próprios, vaquejam o teto das alturas feitos meros artesões do desejo e das ilusões. Olham atônitos. Fixam as portas do Paraíso na alma, contudo figuras impacientes das soluções daqui do Chão. Contam as tantas histórias de que foram senhores no que plantam e sustentam, face ao deslumbramento.

Eis um pequeno esboço da certeza do quanto dominar senão o instinto da Verdade, pois dentro das existências nada mais que sejam além desta condição de observar um quadro irreversível, o Tempo, a tocar à frente o conteúdo das histórias sem fim. Meros astutos navegantes, os seres percorrem essa dinastia dotados das mínimas qualidades, a preencher o painel dos instantes, tudo que ser-se-á logo ali, séculos, milênios depois desfeito na inexistência.

Numa superposição de eras, códigos invadem às consciências em um piscar de olhos. Ninguém que fosse restaria no lixo da imensidão, porquanto há firme determinação do que resta acontecer, e acontecerá inevitavelmente. Pouco importa a ausência agora desse aspecto definito que nos aguarda logo adiante sem maiores emoções do que fosse. Palavras falam disso quantas vezes?! no decorrer dos firmamentos,

plácidos apelos que se deslocam na trilha do mistério e escreve as inesquecíveis consequências daquilo que ora persiste. Viver tem disso, de pensar, sentir, e (quem sabe?) admitir nalgum momento a variável sagrada dos amores guardados na ciência das gentes de que somos partes imprescindíveis... A Eternidade, por isso, pulula nos corações extasiados, aqui de junto, lado a lado com as cores e os sons, sem dúvida o que consiste na imaginação pura e simples de existe e existirá sempre e sempre.

sexta-feira, 20 de junho de 2025

Natureza indomável


Para quem imaginou sem dúvida vir dominando a força dos elementos naturais, o Homem suporta com denodo as marcas impostas pelos efeitos inesperados que advêm nos instantes menos previsíveis da sua história. Um desses acontecimentos supervenientes verificou-se no início da última semana de 2004, vistas as ondas gigantescas produzidas pela acomodação de placas tectônicas no interior da Terra, nas proximidades da Ilha de Sumatra, no Oceano Índico.

Em perdas de vidas humanas, os números até agora ultrapassam a casa dos cinqüenta mil, sujeitos a crescerem noutro tanto, diante das conseqüências da catástrofe, nos principais lugares atingidos, costas do Sri Lanka, país mais prejudicado, além de Índia, Malásia, Tailândia, Madagascar, Indonésia, dentre outros.

O que resta considerar em face de situações desse tipo é que resta muito para se ser auto-suficiente em termos de controle das ocorrências geológicas, no que pesem as pretensões tecnológicas a que chegaram os povos, a lembrar conceitos clássicos chineses, onde Lao-Tsé afirmava: O céu e a terra não são humanos. Não têm qualquer piedade. Para eles milhares de criaturas são como cães de palha que serão destruídas no sacrifício.

Isso a título de reflexão, neste fim-começo de mais outro longo giro do Planeta em sua órbita na rota do Sol, intérmina jornada que o mistério das eras circunscreve há milhões de anos sem fim.

Enquanto as sociedades parecerem esquecer dos valores originais da simplicidade, num turno de práticas insanas, vaidosas, ilusórias, algo, porém, indica possibilidades no querer de tantos atores que adotam posições de comando, a proferir definições coerentes de utopias renovadoras.

A dialética fundamental identifica os dois fatores estruturais da realidade possível; de um lado, entes materiais, no meio dos quais os seres e os objetos; do outro, idéias e sonhos, a formar a base única do pensamento lógico.

Nesta reflexão, portanto, a esperança de reinterpretação da virtualidade desse mundo, quando a lição da dor pressiona a corrida acelerada do “ter” em forma de destruição, desprezados conceitos solidários do agir coletivo, nalgumas nações distantes da Ásia.

A saída de um ciclo anual determina pouco, quase nada, em termos de querer decidir a continuação das velhas práticas, nos meses posteriores. Apenas matricular em novas séries resume a atitude usual de pais e filhos, de memória curta, que guardar pouco dos conhecimentos recebidos, conquanto, mais hoje, mais amanhã, entregar-se-ão nos braços fatais do egoísmo de grupo, nada além do que exercita a grande população que cresce em almas que se expõem aos inevitáveis fenômenos dos dias indiferentes.

Todavia, nunca é demasiado, no alvorecer do mês de janeiro de 2005, desejar aos amigos ouvintes um Ano Novo de Paz, Saúde e Prosperidade! E que os sonhos da melhor felicidade sempre iluminem a consciência de todos nós seres humanos!

quinta-feira, 19 de junho de 2025

O Reino de Deus


Desde que o mundo é mundo que os seres humanos buscam transcender a rotina dos dias, na intenção de achar uma saída honrosa para a condição transitória da existência, restrita ao espaço físico deste globo tumultuado. Durante turnos incertos, outrossim, aguardam o endereço de depositar no solo comum os restos inúteis, ao instante do desaparecimento.

A morte, como se diz, seria sucedâneo natural do viver, que, com isso, recebe a grave responsabilidade no fechamento dos anos, sem, contudo, pessoas desvendarem o mistério da fria passagem neste vale de lágrimas.

A religiosidade, por sua vez, chama para si respostas que se propagam geração após geração. Pessoas desenvolvem percepções de outros níveis de consciência, porém resolução plena deste teorema ainda hoje permanece a níveis particulares de cada criatura, naquilo classificado apenas como matéria de fé.

Assim, diante das considerações das religiões, abrigos dessa religiosidade, apresentam-se as alternativas de uma nova vida, a qual, segundo os cristãos, já começaria aqui mesmo na Terra, durante este período de provações.

Dadas as características insistentes da virtude, um tanto de gente se mantém na ânsia de compreender o radical enigma. Facção sob o prisma rígido da intelectualidade, de acordo com os padrões da ciência racionalista, admite tão só o que vê ou pega, afinada em experiências laboratoriais. São os chamados materialistas, que julgam tudo terminar com o perecimento do corpo, fora de outras chances em planos invisíveis, na hipótese dos místicos.

Outros, estes, os místicos, a seu turno, delineiam interpretações de ordem espiritual, abrindo o processo dito de transformação da consciência, da razão à intuição, caminho ilógico, do ponto de vista materialista, contudo perspectiva de sobrevivência, nos parâmetros dos líderes religiosos, em todos os tempos.

Jesus fala de um reino espiritual (“meu reino não é deste mundo”), o Reino de Deus, vislumbrado na ocasião de receber o Espírito Santo no íntimo do Si próprio, como sonho de revelação do Ser em toda sua perenidade eterna.

Mas para crer em tais pressupostos exige-se haver rendição a uma vontade soberana, inteligente, que a tudo rege, no âmbito universal da Natureza, Deus, do que nem sempre comunga a maioria dos viventes. A existência de Pai superior resulta numa série de referências doutrinárias, base dos credos e das religiões.

Depois, as conseqüências desta rendição presumem uma justiça absoluta, onisciente, onipresente e amorável, luz que clareia os fiéis, razão da transformação em que se apóia a sonhada Salvação, livre deste mundo vasto de sofrimento. O religioso espera, por isso, prêmio maior por tudo o que viver neste chão, alimento confortador no exercício da paciência. A isto os budistas denominam Nirvana e os cristãos, Reino de Deus.

quarta-feira, 18 de junho de 2025

Os artistas de rua

 

Eles são o povo. Nosso povo. Andam e se estabelecem no correr das cidades, espalhados que sejam ao vento da sorte vária. Vaquejam lá possíveis compradores, expectadores, parceiros. Artesões andarilhos do mundo inteiro, vendedores de roupa, de castanha, amendoim, abacate; malabaristas dos sinais, sobreviventes da própria história, resquícios de nós mesmos, nobres da vila, senhores de si. Sabem que um outro dia será sempre, enquanto dormem ali pelas calçadas, nos batentes, nos bancos de praça, a transportar infantes as mercadorias que lhes garantem o sustento. Às vezes, têm família, que as deixam no lar à espera do regresso desses heróis da inconstância social.

       Vejo-os enigmáticos diante dos tantos movimentos da História, dotados das habilidades distantes de formações acadêmicas, resquícios de tempos escassos, soldados da existência a percorrer os entremeios do Destino. Eles, o povo. Tudo que indica a força da Natureza, apesar da ingratidão das lideranças dos tronos do poder. E resistem a todo custo, valentes, aventureiros, ficcionistas da alma além até do que poderiam merecer.      

Numas horas, músicos, aprendizes dos ofícios do relento onde pisam indiferentes ao que virá mais adiante. Mágicos da imaginação, oferecem seus préstimos à indiferença da população esquecida. Sem bagagens, posses, certezas, mesmo assim percorrem o trilho da solidão de que somos feitos a seus moldes, olhos gastos nas verdades que os trazem até nós, seus parceiros assoberbados, ausentes.

        Quais que sejam o Sol que os conduz vidas e vidas, apenas sonham no impossível da visão e adormecem tais seus iguais que residem nas alturas da ilusão. Fôssemos, porém considerar a dúvida na certeza das existências e apenas notaríamos o prisma perfeito do infinito que circula perene. Ele, nós. Nós, eles, pedaços dos frutos da consciência em movimento pelas bordas de um céu imenso que emoldura praças e ruas, caminhos e florestas, nos espasmos da realidade humana.

         (Ilustração: Cultura Plural - https://culturaplural.sites.uepg.br/?p=1827).

(

domingo, 15 de junho de 2025

A imbecilidade das guerras


Nesta época de tanto desenvolvimento tecnológico, tanta experiência de tudo quanto é qualidade, tempo de avanços mil nas mais diversas áreas do conhecimento, de quanta beleza na música, nas artes como um todo, enquanto se enfrenta uma pandemia de largas consequências em todos os quadrantes, sob os riscos vários da ausência de meios de controle; enquanto bilhões padecem da ausência de sentimento humanitário coletivo, com pessoas a morrer de fome, de sede, ausência de moradia, de cultura, de segurança, esperança; exato neste momento de quanta expectativa, inclusive em matéria de preservação da espécie na face do Planeta, veja o que se percebe, início de mais um conflito entre nações tão carentes quanto a nossa Humanidade inteira. E ouvimos falar que, na fronteira da Ucrânia, os russos acantonam tropas e já existem movimentações belicistas de países outros envolvidos nos interesses geopolíticos em jogo.

Não bastassem as consequências dos dois conflitos mundiais que ocuparam o século anterior, eis que a imbecilidade do gênero humano parece crescer de novo nos próprios cascos e sujeitar toda a espécie numa das suas aventuras de frutos indesejáveis. O arsenal das armas acumuladas no decorrer dos últimos 60 anos, à base da fissão nuclear, nos dias de agora, possui poder destruidor capaz de eliminar de tudo a vida na face deste Chão.

Durante milênios haverá de ser isto tudo o que se aprendeu nos campos de batalha, de feras contra feras, pessoas contra pessoas? Nem vejo margem a maiores avaliações, porque sobra indignação e somem as palavras; todos, fracos contra fracos, sem o mínimo senso de civilização qualquer que seja, de ordem espiritual, ética, filosófica... Inútil dizer o mesmo que disseram os sábios durante a História, e ainda falar dos mesmos vícios e da mesma perversidade que dormem na inconsciência dos líderes?!

Que o poder maior das potestades superiores toque a alma dessa gente e lhes permita raciocinar em termos de Paz, eis tudo de que carecemos hoje e sempre!...

(Ilustração: Le Monde Diplomatique Brasil).

sábado, 14 de junho de 2025

Esconderijos do passado

 


A
s entrelinhas do Tempo bem que resumem o que transcorreu e desaparece nalguns segundos. Quando menos esperar e lá se foram emoções e objetos, amores, fidalguias, tudo feito fantasmas ora inexistentes, indo sumir nas profundezas da superfície densa, amorfa, cinza dos mares do Destino. Obstáculos a isso ninguém até então descobriu que não seja gravar nos discos de memória aquilo que jamais retornará, pois.

Sei que sim, que se perdem no frio do anonimato todas aquelas danças felizes, ou aparentes frustrações e descaminhos, num mundo só largado ao vento e nada feito. A gente quer sentar e reunir outra vez as réstias do que ficou, no entanto em meras fantasias agora surdas e exangues, no mínimo um mistério sem limite do acaso.

Isso mexe sobretudo nas noites de lua cheia, quando um silêncio assustado invade as horas e deixa entrever o que já foi e perdeu-se talvez nas próprias lembranças desfeitas. São saudades insistentes que desejam regressar e nunca descobrem o jeito de fazer, vítimas por cento do desgaste impertinente disso, do mistério sem limite que circunscreve as cartas de navegação do quanto existiu.

Viver traz consigo as condições de estar aqui, sobremodo de tocar em frente o instinto de ser assim. Enquanto isto, o sistema de percorrer as estradas exige pertinência, disposição de aceitar o programa em que somos criados, cabeças em movimento pelas trilhas dos momentos inesperados. Conviver mesmo em aparente harmonia, todavia absortos nessas interrogações que, vez por outra, acordam e indagam as razões de presenciar, apenas isso, durante os espasmos das lutas humanas, inclusive no intimo e nas madrugadas mais frias.

Essas presenças absortas que testemunhamos, que alguns denominam seres, habitam, portanto, espaço estreito entre as pedras que rolam e suas mesmas cicatrizes gravadas no coração. Decerto haveremos de concretizar o sonho desse passado no dia que seja ao despertar e, de olhos abertos, avistar o princípio da certeza agora esquecido nesta fase de revelação.

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Instinto de sobrevivência


Nesse furor das invenções de que ora somos o resultado impera força maior de resistir a todo custo. Aonde for, ali haverá milhões que se perguntam a que vieram. Seguem, no entanto, independente das respostas, porque sabem, lá de dentro, que vieram a algum objetivo. E sustentam a carga de sacrifício de presenciar a tragicomédia desse tempo esdrúxulo, onde tantos impõem a quantos o desejo de continuar no todo custo, pois. Um painel de interrogações, pendurado no pescoço das multidões, pede, no entanto, socorro das lideranças que as enganam, mormente palavras soltas dizerem as ordens de sofrimento que hão de obedecer.

Buscar, pois, compreender o enigma disso tudo significar perdurar o quanto seja a equilibrar as balanças do mistério. Ninguém que assim pretender atenderá no tanto ao império de interrogações vagando pelo impulso de sobreviver.

As histórias explodem soltas pelos ares. Mil espetáculos de dúvidas fervem o cérebro das criaturas, ainda que submissas aos credos da fama e do prazer. Porém o que resta soma velhos pergaminhos inteiros ao solo dos contentes. Nasce, com isso, uma verdade só aparente, donde raros acreditam retirar o significado dessa parafernália inconsequente. Somar a isto o vasto passado largado fora em migalhas é querer sonhar noutros universos e bem isto alimenta o espírito de aceitar as condições aqui trazidas no impulso do inevitável, conquanto outra visão de nada serviria. Conceitos, compreensões, atitudes. Animais acuados na lama do que produz olham entre si a porta possível de reviver e narrar diferentes segredos, quais da nada soubessem até então. Porquanto dizer de tais apreensões pouco representa dos frutos atuais de uma tal civilização acuada entre os próprios métodos e objetivos. Nisto, todas as regras da boa convivência impõem situações definitivas, a determinar a procura do senso comum na essência dos seres humanos, início de largas e inevitáveis transformações.

quarta-feira, 11 de junho de 2025

Além da dualidade


Dualidade, que significa a duplicidade com que as forças da natureza desenvolvem seu procedimento. Dois lados. Os dois pratos da balança que norteiam o sentido de todos os elementos. Aonde ir, ali haverá tais condições aqui no Chão. Nem adianta esconder de si essa dependência ao duplo na condição material, porquanto isto significa a Lei, o princípio único de tudo ter o seu contrário, a fim de poder existir nessa condição material.

Tanto nos céus, quanto na terra. E dentro dos seres humanos, bem no íntimo do ser. Só que é este um estado transitório, face atual das existências dos que vivem no mundo físico e têm de obedecer a leis e princípios. Fugir sem ter direção. E caracteriza o laço da presença dos viventes em meio aos desafios desse estado dagora, que resta compreender a que viemos e qual a sucessão natural dos acontecimentos.

Filósofos perduram, no decorrer dos tempos, a dizer que essas funções bipolares dos organismos correspondem à possibilidade da resposta do viver através da consciência, até achar o pouso definitivo que aos místicos corresponde totalizar um ente maior, a inteligência suprema, Deus. Nisto vivemos, de um dia chegar a Ele, ao Pai de todos nós.

Mesmo que dentro da gente persistam as duas naturezas numa peleja entre elas, contudo há o fiel dessa balança se completará um dia. Nesse equilíbrio, a luz far-se-á. Conquanto negativo e positivo perdurem na troca de passos da estrada, o destino será a união dos dois polos num encontro definitivo com a Razão maior que a tudo rege e domina. E nisso estaremos cientes da sabedoria inigualável da Natureza mãe, senhora absoluta de toda a perfeição harmoniosa da Criação.

Desde sempre, portanto, que os humanos buscam interpretar os códigos sob quais existem e sobrevivem, amam e crescem. A sinfonia encantadora dos mistérios e dos sonhos a isto conduzirá na história e nos seus protagonistas.

terça-feira, 10 de junho de 2025

Dias alegres


Os olhos que enxergam a paisagem são os nossos olhos. A cor da paisagem quem vê somos nós. O mundo existe independente, mas nós lhe damos o tom, a melodia. A paisagem existe lá fora, no entanto de dentro quem a vê seremos sempre nós. Daí a imaginação de que fomos criados a fim de dar sentido aos mundos e seres. Isto é, o panorama existe objetivamente, não fosse, contudo, a nossa existência ninguém registraria tais existências. Somos o sujeito das existências, inclusive de saber da nossa existência.

Dizem os existencialistas que, nos outros seres, a essência precede a existência. Vêm do jeito que serão. Já nos seres humanos a existência precede a essência; ainda não sabem o que virão a ser ao sair de volta. Animais, coisas e lugares nascem animais, coisas e lugares. O ser humano haverá de se fazer ser humano, deixar de ser só um objeto em movimento ocasional. A essência, o ser, nos humanos virá depois que existir, condição necessária. Se não, estará sendo tão só mais um animal, ou coisa, ou lugar, em que a essência estaria em potência sem realização daquilo que trazia quando chegara à existência.

Bom, essas tiradas conceituais resolvem o desejo de contemplar a paisagem do dia, uma manhã bonita de nuvens de chuva, chão molhado e frio gostoso pelo ar. Os dias que sucedem aos dias. As belas manhãs que enchem de vistas a alegria, quando a gente abre o coração e recebe de bom grado viver com intensidade o deslindar do tempo. As certezas, as pessoas integradas no gesto de viver em paz que elas delas conseguem obter. Horas de boa vontade.

Todo instante traz frutos bons, desde que plantemos à luz dos sóis em nossas almas, trabalho de quem busca inteiro o motivo de viver. Há, no que há, religiosidade plena, que nos resta desvendar através da sabedoria. Oferecer o melhor de si aos acontecimentos do Universo. Espécie de doação boa a nós próprios, viver pede inspiração. Dias alegres durante as existências, eis, em resumo, a razão principal do ato de existir

segunda-feira, 9 de junho de 2025

As férias de julho


Depois de virmos morar em Crato, na segunda metade de 1953, ano do centenário do município, só voltávamos ao Tatu nas férias de julho. Isso por conta do ano escolar e das moagens do sítio, que coincidiam na programação da família. Havia transcorrido o período chuvoso, que aumentara as águas dos açudes e trazido um clima menos quente ao Sertão cearense.

Logo da primeira vez, foi de causar espanto face a tanta saudade acumulada naquele menino de cinco anos, retirado das origens num repente. Ao chegar, saía na procura do que havia deixado lá atrás; os animais, as lembranças dos lugares, a capelinha, nossa casa, a casa grande, as árvores, cercas, currais, engenho, os moradores, as famílias deles, os amigos, tudo enfim. Uma sensação de rasgar o peito, passados que foram tantos meses de ausência daquele mundo ali guardada no peito há tantos meses.

As primeiras oportunidades anuais, no entanto, terminavam com o transcorrer dos dias, e, de novo, a dor das novas ausências apenas realimentadas daí a um ano inteiro. Porém aos poucos iria me enfronhando com a cidade que nos recebera; as escolas, os colegas, as ruas e praças, sorvetes e picolés, pão do reino, revistas, livros; as distrações urbanas, os filmes; sim, os filmes de cujos cartazes a gente tomava conhecimento algumas semanas antes da exibição.

Qual que espécie de contração íntima, quem sabe? numa traição àqueles amores antigos ali abandonados, me examinava a sinceridade aos meus apegos de um passado tão amoroso posto de lado à conta de novos amores. E isto mexia comigo, a cotejar num exame de consciência que ainda hoje passo a lembrar. Aonde perdera minha história, em que verão escorrera da memória aquele passado inesquecível?!

No transcorrer, pois, disso tudo, agora examino por dentro meus sentimentos à cata dos tais valores que o Tempo se encarregou de transformar... É quando mais insisto nessa busca de preservação, ao contar, pouco a pouco, nos mínimos detalhes de mim próprio, a intenção imaginária de me reencontrar e viver sempre essa fase de vida original e verdadeira que uma vez conheci e não desejo nunca perder, jamais.

domingo, 8 de junho de 2025

Luz da manhã


Essas variações multiformes existem desde sempre entre a criatura e o Criador, isto pela necessidade do aperfeiçoamento inevitável. Havia de ser que houvesse de experimentar o abismo e encontrar o caminho de volta da Consciência, e rever o teto das alturas ao sobrevoar o inexistente a nossos passos. Degustar do amargo e desvendar a perfeição ali de dentro da própria criatura. Mais reencontro, interpretação da Justiça no seio da Natureza, e nisto ser os artesões e fiéis senhores da plena revelação do Ser.

Neste exemplo do nascer do Sol bem isto significa, a todo tempo, na medida dos primórdios lá de quando houve o primeiro momento de tudo quanto existirá, pois. Nós, conosco, face a face nos trâmites dos destinos. Autores e protagonistas da epopeia da perfeição, tudo numa simplicidade a causar espécie aos olhos da Eternidade. Bem aos moldes da exatidão absoluta, cá se toca adiante o barco do Infinito, em demanda dos Céus que nos aguarda de alma e coração.

Isso acalma de saber, conquanto somos o início e o final dos baldrames que sustentam a certeza, em nossos seres. Fagulhas do princípio em movimento, habitamos a casa dos desejos ao definir nossas escolhas rumo ao transe da Liberdade. Desses minúsculos instrumentos virá o objetivo das horas, donde, aqui, contemplamos a suavidade multicor das quantas belezas em nossos olhos. Vezes sem conta, palmilhamos a pureza e disso aprimoramos a nós mesmos, próximos senhores da Felicidade.

A imensidão de tanta suavidade transforma o sonho na pura perfeição de que somos partes integrantes, acima de todas suposições em contrário. Apenas a desvendar o mistério de Si e, logo após, no Tempo, distinguiremos aonde chegar, nesta força soberana que preenche e contorna o sentido das muitas existências.

sábado, 7 de junho de 2025

Quadros e galerias


Os melhores quadros nunca chegam às galerias. As melhores inspirações nunca passam além do peito, isso porque não conseguem sair e dizer o próprio nome, forma e significado.

Nisto, aqueles que as encontram, e recebem de si próprios, jamais resistiriam dizer tanta beleza, contar de tanta poesia, porquanto a força incontida do viver impõe nisso condições inestimáveis. Quantas vezes vêm sendo assim, pelos séculos mais distantes, de se avistar as paisagens, os mistérios, as manhãs agradáveis, e não saber, hoje, sempre, nos outros dias, transmiti-las em termos artísticos.

Olhar o céu, o mar, a serra, o sol; sentir a energia do som, da brisa; e não conseguir falar de tais qualidades, impossíveis de caber nos pensamentos, nas palavras, nos versos, sons, telas, nos filmes, nas fotografias...

Os mais destacados artistas, todavia, insistem e se entregam ao ofício de colher as flores do tempo e oferecê-las em forma de criação, para passarem de mão em mão, querendo eternizar o fugidio, multiplicar o momento, dizer de tanto mistério, e não buscar adquirir o poder das coisas perfeitas, trazê-las em códigos, passá-las além de si.

Muitos até que um pouco disso conseguem, mas, sendo desse jeito, raros são aqueles que se apercebem de tanta beleza, do tanto de poesia que transmitem os maiores artistas, para passar de mão em mão os painéis inimitáveis da Natureza, no quadro desta vida, querendo, através do sonho da arte, eternizar o fugidio, domar o indizível, multiplicar o momento, vencendo a impossibilidade de passar além do peito as maiores inspirações, as fazendo sair, quase sem conseguir, lançando além das vagas as doces mensagens infinitas dos sonhos e brisas.

Isso porque os melhores quadros nunca chegam às galerias... Aqueles que os encontram silenciam, no sentido de tanta beleza, tanta poesia, a lhes doer dentro do peito, falando de algo que não podem passar além de si, porque não conseguem transmitir, dominar o momento, satisfazer o fugidio. E ficam, desse modo, a contar só as notícias daqueles melhores momentos, quadros esses que existem nas folhas soltas dos dias, nas luzes eternas da existência, porém que jamais chegam às galerias. 

Diz o credo taoísta, religião chinesa de alguns milênios passados, sujeite-se ao efeito, e não busque descobrir a natureza da causa, modo de querer paz, em face de tudo que neste mundo aconteça. E feridas pedem tratamento; as palavras adormecem nos livros, almas vivas, nas luzes do sentido leve de todas coisas, ontem, amanhã, cada dia...

terça-feira, 3 de junho de 2025

Além de tudo


Isso que determina de dois serem um só lá certa feita. Quando, no vértice, hão de se encontrarem, na razão do quanto existe durante todo tempo. O fruto de todas as buscas em movimento. A soma das horas num só princípio. Reunir os pensares no sentimento definitivo. Ausentes da matéria, lá onde antes esteve o ser, sentido absoluto das galáxias advirá radiante. Pressupostos concretizados. Junção das palavras em verbo soberano. Vertente das transcendências, definição do que perdura, na essência do Universo. A sequência natural dos acontecimentos, a preencher de vez o senso dos oceanos. Concretizar o impossível pelas horas do firmamento, e deixar ao léu as normas da concretude que ora some.

Na consciência desse artesanato dos sonhos de ser feliz, dali provém a manhã dos corações em festa. Síntese de véu imaginário, agora o crivo das emoções desde sempre desejadas ultrapassa o teto dos objetos e leva ao senso da Verdade plena. A tanto eis que estamos. Vidas sucessivas, e essa intenção far-se-á realidade, ao sabor do indizível nas palavras. Qual seja o destino e motivo de infinitas decisões, nos veremos face a face com este princípio da realização efetiva.

Foram desfeitas, pois, hipóteses infinitas de dentro das criaturas, frutos do encontro consigo mesmo através do Amor. A imensidão de cascalhos esquecidos tempos afora fertiliza no seguir das intensões. De muitos anseios apenas resta, agora, o valor principal de usufruir da existência em películas perfeitas de Paz.

Portanto, a que seguir na busca de construir a abstração viva que ora seja esse valor inigualável da Felicidade, vista haverá, em todos, a semente luminosa aos poucos transformada em perfeição. Eis o que  habita o íntimo das presenças, no âmbito da Criação, isto a desvendar o mistério multiforme de tantos passos até aqui.

domingo, 1 de junho de 2025

Rastros na imensidão


E depois de tudo ainda ser feliz... Palmilhar o chão das almas e continuar, vidas e vidas. Refazer as circunstâncias à nossa maneira, reviver os sonhos, esquecer o roteiro das lendas, e, mesmo assim, ter força de sustentar as grades do Destino sob nossos pés. Sobreviver, no entanto. Existir, por demais, além, que seja, das cruzadas que foram vistas nas barreiras do impossível... Estar onde esteja e contemplar os céus no calor dos dias em volta, traços nítidos do que virá inevitavelmente. Contar as palavras e delas somar os detalhes desse universo íntimo que aqui transportamos em silêncio. Nutrir, portanto, o imã dos desejos; fazê-lo parte da consciência; e deitar fora partes essenciais daquilo que antes fomos. Viver, qual seja isto, nos pedaços de nós mesmos largados pelo caminho do futuro, nesse transe estratosférico das luas e dos sóis inevitáveis de contar.

A gente para e observa a quanto o Tempo se resume dentro da presença, transposta aos instantes e mantida sob a guarda do mistério tenebroso. Nós, infinitas criaturas a preencher o claro do firmamento de ruídos e noites escuras, enquanto não houver paz. Seres esparsos esses, deixados no vento das eras e contados, vez em quando, nas histórias esquecidas de livros e filmes. Nisso, desliza constante o princípio das interpretações, logo ali transformado em lixo orgânico e transposto ao colo dos inocentes. Conquanto só visagens, as telas do Infinito determinam a que chegamos e seremos logo em seguida.

No espasmo, pois, da servidão a que isto se submeter, daí rompem as versões sucessivas de reencontros, a percorrer o tablado cinzento do que transcorra entre os ossos e a carne viva dos séculos. Com isto, os pelotões que habitam a sorte hão de escrever, com precisão matemática, o roteiro da Criação no ermo de todos nós, aventureiros da plena felicidade.