Tais diante de um espelho onde o passado busca encontrar esse outro eu que não existe mais, espectros de si mesmos rodam, bem ali, o mistério de depois. Na ânsia de dominar o que há de vir, isto resume um todo que nem agora continua. Ser-se-á fantasmas de quem mergulhou nos pensamentos e desapareceu em seguida, quais ausências em atividade na crosta da imaginação. Isto de avaliar, desde sempre tem alguma razão de permanecer onde nunca esteve. Eis a fonte dos desejos, propensão de ocupar o palco de um circo definito que habita o íntimo das criaturas humanas. Esse o mito do que virá, no entanto andam em quadras livres pelos sóis que se renovam neste universo das relatividades.
Contudo, pouco a pouco deixamos cair a máscara do anonimato e sumimos de vez pelas profundezas do inevitável. Repastos do Tempo, sustentamos, quantas e diversas vezes, vidas afora, o delírio das possibilidades, e nisso preenchemos diversos papeis já triturados pela fama das multidões enfurecidas. Esquecidos do que somos, apenas ocupamos trajes rotos e casas abandonadas. Assim, tangemos comboios sucessivos através da solidão, um a um lívidos e apáticos da essência verdadeira que nos trouxe até então. Lúcidos, por vezes, todavia amorfos e parceiros do esquecimento.
Destarte, hoje avistamos o vazio das ilusões e as deixamos escorrer entre os dedos, restos ressequidos das oportunidades jogadas fora. Achar-se, descobrir o senso da compreensão e atirar, de corpo inteiro, a alma aos sons metálicos das horas. Invadir os séculos de antigamente, a degustar, de novo, o sabor da inocência, feitos meros instrumentos de uma realidade adormecida no coração da gente. Quantos sonhos, farnéis e deslumbramentos, postos de lado passadas que foram as versões originais criadas na euforia ou na angústia. Conquanto servidores fiéis da dúvida, sós e afoitos nos abandonamos de tudo aos conceitos acumulados, talvez ainda descrentes da verdadeira consciência.
(Ilustração: Amaringo).
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