terça-feira, 30 de setembro de 2014

Zadig

Dentre os livros escritos por (François-Marie Arouet) Voltaire, há pelo menos dois que significam momentos excelentes da boa literatura universal, dados o estilo claro, humorado, e a pura diversão que representam, espelhos primorosos da condição humana. São eles, Cândido ou o Otimismo, e Zadig ou o Destino. Neste, dividido em capítulos curtos que descrevem a vida tumultuada de um babilônio através de alguns povos orientais (cheio das saídas astuciosas do Pedro Malasartes nacional), o personagem-título, depois de vendido escravo a mercador árabe de nome Setoc, acompanha seu proprietário na cobrança de 500 onças de prata emprestadas a um hebreu mau pagador.

Na ocasião do empréstimo, duas outras pessoas presenciaram a transação, porém elas morreriam no período, ocorrência favorável ao instinto velhaco do devedor. Chamado pelo credor a honrar o compromisso, o judeu alegou não devê-lo, porquanto havia absoluta falta de provas da conta.

Desapontado, Setoc dirigiu-se a Zadig, cativo de sua confiança, e segredou os pesares do acontecimento, na busca de apoio. 

Após ciente do desgosto do senhor, Zadig quis saber em que lugar os dois tinham realizado a negociação do empréstimo:

- Em cima de uma grande pedra – tornou-lhe o mercador – que fica ao pé do monte Horeb, conta Voltaire.

Em seguida, inteirou-se a propósito das principais características do devedor, indo ambos comparecer em juízo, instância que restava para promover a cobrança.

Exposta a causa na audiência, o magistrado solicitou as provas do débito, no caso, o depoimento de testemunhas. Zadig alegou, em defesa, que testemunhas não mais existiam, porém enorme pedra poderia substituí-las, restando apenas que o julgador emitisse ordens para que a procurassem e trouxessem, naquela hora, e tudo se resolveria.

Intrigado com a proposta, o juiz prosseguiu nos despachos da sua atividade judicante. Ao término dos trabalhos, em tom de gozação, dirigiu-se a Zadig e perguntou:

- Então, ainda não chegou a vossa pedra?

Nisso, o hebreu tratante embarcou na galhofa do magistrado e, rindo, considerou que ela não chegaria nem no dia seguinte, vez localizar-se a mais de seis milhas e serem necessários quinze homens para removê-la.

Hábil, Zadig manifestou de pronto o seu triunfo, reafirmando que a pedra, sim, serviria de testemunha do empréstimo. Ao identificar o sítio em que achá-la e conhecer a sua dimensão, assim o réu confessava a autenticidade do débito sobre cuja pedra contraíra. 

Diante do encaminhamento lógico dos acontecimentos, outra alternativa não restou ao credor senão reconhecer a dívida que negara, recebendo a sentença de permanecer amarrado à pedra, sem comer, nem beber até pagar a conta.

O célebre autor francês conclui acrescentando que, depois do sucedido, Zadig e a pedra passaram a ser muito celebrados na Arábia.          
      

domingo, 28 de setembro de 2014

Sonho bom

Provar que a pessoa a quem se ama chega e aqui permanece ao seu lado com o amor do tanto do que traz no coração, na luz da mais perfeita harmonia, sem medo, sem preconceitos de qualquer natureza, isso a formar o par exato de vontades que preenchem o Universo das alegrias e satisfações, desde o corpo ao sentimento, nas profundezas do Ser maior.  Quando somem as dúvidas e avançam as certezas da totalidade plena, só o amor mais sublime, tranquilidade na alma e paz no silêncio de almas em festa. 

A fixação de todas as certezas de que há realidade na esperança, desenho sublime de beleza, confiança na plenitude do prazer que envolve sombras e transforma os tecidos da existência na pura leveza do firmamento em organizado. Claridade fixa de cores esplendorosas dos quadros da natureza mãe, encanto dos mares a sol aberto, pureza do pulsar suave de todos os corações felizes. A realização dos ideais infinitos da Verdade nos mínimos detalhes.

Há, em forma de desejos intensos, o plano de um dia achar o pomo desta felicidade, réstias escondidas no íntimo de todos, porém reserva guardada a sete chaves diante do limite ainda imposto pelas circunstâncias. No entanto persistirá em sentido de vida esse objetivo, que irá acontecer logo ali no adiante da continuidade eterna. Lá neste dia se abrem de par em par os portões da concretização, resultado limpo das oportunidades aproveitadas, mostra evidente do poder descomunal da ordem que impera além das maiores dúvidas. 

Nessa hora, em passe de milagre impossível, o sonho bom dominará o teto das catedrais do Amor e preencherá de Tudo a imensidade do Nada absoluto, na definitiva prudência do Equilíbrio. 

Sabor exato da fortuna, som universal dos músicos andarilhos, contentamento de inúmeras buscas, completude, soma de todos os algarismos, unanimidade das palavras, principia nascer o ideal das utopias no palco definitivo da Existência.

Sabença de caboclo

Talvez por pretender contrariar o princípio de que cavalo ruim se vende longe, Chico Ivo tratou de camuflar muito bem a deficiência do animal com a instalação mais do que perfeita de outro belo rabo no baita cavalo luzidio, untado com esmero numa mistura gosmenta de breu e cola de marceneiro, disfarce primoroso da alisada vassoura de longos fios selecionados.

Junto ao toco, implantara a nova cauda, recolhida dos outros bichos no decorrer de longos meses, cabelo a cabelo, que de firme mostrava-se suficiente para confundir os maiores especialistas, como deixará provado. Concedia, inclusive, ao equino ginga do tanto de esboçar ligeiras e saudosas abanadas, qual nos velhos tempos inteiros.

Bom, foi assim que resolveram desafiar o furdunço da feira de Lavras da Mangabeira, buscando o pátio dos bichos onde não teve mesmo quem viesse de notar a gauribagem. Tudo limpo no céu do meio-dia.

Interessados não custaram a aparecer com suas pretendências e propostas. Examinavam o cardão de cima abaixo, afagando a pelagem, friccionando o lombo, sempre cuidando de olhar dentes, cascos, orelhas, na mania dos espertos.  Porém foram, de verdade, os ciganos que primeiro se fixaram na intenção da compra, seguindo logo, logo, saber do preço.

Conversa vai, conversa vem; regateia daqui, regateia dali; negócio realizado. Cabresto na mão, dinheiro no bolso, e satisfeitos, certos de uma boa transação, restava aos negociantes pegar estrada e buscar o destino da tropa, nas estradas poeirentas do sertão.

...

Passadas se foram algumas luas, ritmo obediente das ordens naturais. A tranquila cidade daquele tempo mudou quase nada em meio à ausência de acontecimentos marcantes.

Lá noutro dia, noutra feira de maior movimento, gente muita, muita animação comercial, difícil até de se achar a quem se procura entre tantas caras, eis com que Chico Ivo se defronta, de imediato reconhecido... Com os mesmos ciganos que lhe haviam adquirido o cavalo. Vinham de longe acenando para garantir o encontro casual inevitável:

- Ganjão, ganjão! Aguarde um pouco que seja.

- Não quero nem saber, - reagiu enfático o antigo proprietário do animal. - Negócio feito ninguém desfaz. Fechado está assim restará. 

E quão admirado ficou Chico Ivo com a resposta que lhe veio do cigano à frente dos demais:

- Se despreocupe, ganjão. Fique tronquilo. Nosso objetivo é outro. O que passou tá atrás. Viemos aqui foi lhe fazer outra proposta, de que o senhor aceite, a partir de hoje, seguir com a gente e chefiar nosso bando.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Deixar a vida alheia e cuidar da sua

Se pensar no grau de dependência de tantos a fatores equivocados implica notar o quanto de desocupação existe na cabeça de algumas ou muitas pessoas. Esquecidos de comer, beber água, se transportar de lugar, usar energia elétrica, telefone, ocupar um espaço, educar a família e exercer um trabalho que lhe dê a sobrevivência, ainda existe cidadão que pára só examinando e criticando os outros, isto sem a menor das cerimônias, quais fossem donos absolutos das verdades permanentes, soberanos alienados de reinos imaginários. Passam lá longe da realidade e do sistema que compõem as engrenagens da existência.

A energia de que dispõe cada um dos habitantes deste chão significa o suficiente a cumprir o rigoroso papel na busca das respostas fundamentais dos seres: Donde a gente vem; que é que faz aqui; e aonde vai, na estrada infinita da Eternidade. Essas as perguntas principais de toda filosofia, circundam os pensamentos até chegar às respostas a nível individual, mas na coletividade a rotina pede que se deixe a vida alheia e cuide da própria vida, assunto já de tamanho descomunal.

Em uma espécie de vacilação de rotina, os infinitesimais pequenos grãos que representam os humanos insistem na onda de querer solucionar o problema dos outros, quando, tantas vezes e quantas vezes, enquanto atolam os pés na incerteza. Olhos abertos aos outros, perdem o tempo precioso na intenção duvidosa de resolver grandes questões fora dos seus atributos. Enxergam fácil o argueiro da vista alheia, porém nada de avistar a trave que lhes encobre a visão.

O quanto antes, pois, resolver abandonar os defeitos que escondem o horizonte da verdade pessoal comporta agir nos interesses essenciais do que somos nós; modificar o excesso de zelo com relação aos irmãos; e afinar o instrumento da personalidade, com proveito nos resultados favoráveis da boa harmonia social, além de oferecer o exemplo positivo que isto sempre irá representar.   

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

4.732

Sempre que retornava, ali estava ele, 4.732, a lhe esperar de braços abertos, às vezes com um buquê de rosas amarelas escondido atrás das costas, para logo explodir num riso franco, a mostrar todos os dentes, enquanto passava o outro braço pela sua cintura feliz, altaneira. Um par perfeito, ela e 4.732. Ninguém de consciência em ordem acrescentaria qualquer mácula àquele relacionamento de promissão.

Viajasse, jamais 4.732 deixaria de mandar-lhe mensagens variadas nos meios ao dispor, épocas eletrônicas digitais, fossem de transatlânticos, aeroportos, “shoppings”, livrarias... Importava que não lhe restasse esquecido o contato de sonhos que alimentavam qual raça de bicho em extinção, amor de almanaque que vivia às 24 horas, nos tempos de ecologia militante dessa fase da civilização, chovesse ou fizesse sol, razão primeira de várias existências juntos.

Numa dessas andanças por esse mundo, atravessou pelo juízo de 4.732, tipo de bólido intruso, pesadelo doloroso, quando, em lampejo onírico, simulou-se um retorno sem a presença de um deles dois, que ela houvesse buscado por ele sem achar, frustração de não ter mais tamanho, contudo fora de quaisquer cogitações, porquanto alimentavam durasse a relação infinitos mundos e séculos eternais.

Depois daquilo, precedente funesto de haverem perdido contato ainda que em sonho, 4.732 desconfiou que algo de anormal pudesse conspirar, quem sabe para desaguar num dia comum?, a ocorrer no fluir das tantas reencarnações por eles já vivenciadas com êxito pleno, a ponto de nutrirem a certeza certa de um par perene.

O pensamento plasma acontecimentos quando fixado na intensidade suficiente. Mas não se pretende considerar que essa realidade visse pelo pensamento. No entanto, belo dia de verão, sol aberto, céu claro de poucas nuvens, brisa quente no rosto suado, ela chega em casa após dia de trabalho intenso. Baixou os pacotes sobre a mesa da sala de jantar, passou a vista pelos diversos cômodos, e nada que denunciasse a presença constante de 4.732, caso permanecesse na cidade. 

- Beeheeem!!!!?????... Beeeeeheeeeem?...

Estirou o longo pescoço de dama distinta aos quatro cantos do quintal, e um vazio dolorido de quando a pessoa amada se ausenta sem deixar vestígios além do augúrio da saudade a perfurar vertigem na barriga dos medos abandonados antes de encontrar a pessoa amada, esperança boa. Nenhuma vivalma fez o gesto de entrar no palco do instante.

Ela viu-se preocupada ao notar primeiros sinais de impaciência aparecendo por baixo dos lençóis frios da cama por fazer da manhãzinha, na pressa de sair para o trabalho. Esquecera de fechar a janela, nem perguntara a 4.732 quanto ainda permaneceria em casa antes dos compromissos vespertinos.

Desceu a escada sinuosa rumo ao porão. Nisso percebeu as lágrimas rasgando caminhos do peito através dos olhos ressecados e descer rugas abaixo que lhe habitava o rosto, nos trilhos laterais do nariz, preço que pagava por dormir pressionando a face contra o travesseiro cheio de ervas do campo.

Na solidão invasora que chegava de surpresa, apenas conseguiu recolher as roupas secas do varal, antevéspera de chuva ligeira que lhe misturava o choro, na fisionomia lamacenta dos derradeiros resquícios de maquiagem improvisada no escuro da madrugada. As réstias escassas de luz trouxeram ao espelho marcas finais da lembrança que para ela agora retornavam longe, visão preciosa de 4.732 a puxar uma mala pelo galpão da rodoviária barulhenta, despedida suave e silenciosa dos dois, só sob o testemunho dele absorto. 

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Cenário crítico mundial

Houve um tempo, na história da humanidade, em que o idealismo prevalecia na firme intenção de resguardar a oportunidade de pôr em prática sonhos alimentados por filósofos e autores românticos, em modos e formas de governo apreciados como os melhores petiscos do cardápio político. 

Agora, no entanto, as coisas tornaram-se adversas nos planos internacionais das administrações dos Estados poderosos, quando a melhor idéia passou a pretender controlar só os planos econômicos, por meio da prevenção dos moldes sociais, sobretudo nos países atrasados e submetidos a duras penas. Os ricos deixaram de fomentar governos democráticos, sob o pretexto de que há uma ameaça pairando no ar, modelos bem adequados aos tempos sombrios dos regimes totalitários dos anos 30.

Quer-se ver diferente do que insistem os senhores ditadores ricos dos G-8, porém a coisa cresce em proporções jamais adotadas noutras épocas e o que se tem são tropas de elite invasoras dos territórios de rico subsolo, comprimindo a válvula da tolerância coletiva às raias do que é o terrorismo avassalador e covarde. 

Outro quadro sintomático do nível de revolta que se expande nos dias presentes são os constantes atentados verificados no Iraque ocupado. Aquilo que haveria de ser apenas um passeio pelas águas da Mesopotâmia reverteu-se numa guerra suja de resultados inavaliáveis, marca delituosa dos métodos capitalistas de resolver questões particulares em solo estrangeiro em desrespeito flagrante pela cultura e história daqueles povos marginalizados em face da superioridade bélica adversa.

Até as respostas dadas pelos costumes libertários da nação americana, construídos tornam-se gestos panfletários isentos de maiores reações ou mobilizações da mídia e da população, ora ocupada em sobreviver em bases competitivas. Valores adquiridos nos tempos heroicos da Revolução Americana e da Guerra da Secessão, confirmados pelas vitórias nas duas Grandes Guerras, revertem-se no pânico crônico de defesa fomentado pelas lideranças preocupadas em manter o patrimônio ocidental da riqueza. No mesmo passo, as ações suicidas dos árabes injustiçados indicam componente de tristes expectativas futuras, beirando os trágicos acontecimentos das Cruzadas, em que cristãos e mouros se dilapidaram sob traumáticas situações intermináveis.

Um espírito conciliador de líder autêntico e fiel aos pressupostos da dignidade universal carece de vir ao centro desse trágico cenário, reformulando as teses de defesa da diplomacia em xeque, apondo nova ética aos padrões verificados. 

Antes que isso ocorra, a imprensa mundial mostra ao fastio as dezenas de mortes diárias de trabalhadores e populares, jogo absurdo de memória infame, para descrédito de todas as possíveis virtudes que geraram a civilização humana que até aqui se formou na sombra da paz no Planeta. 

(Foto: Jackson Bola Bantim).

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Temperatura elevada

A cada ano se percebem médias anuais mais elevadas de temperatura em nossa Região, efeito por certo não só nesta parte de mundo, conquanto já merecemos conceitos de localização privilegiada, diante das condições de oásis sertanejo. A sombra da Serra do Araripe e seu micro-clima de um vale fértil, dota de manchas verdes sobretudo o núcleo Crajubar (Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha), de tradicional referência a quem buscasse as amenidades de brisa suave e permanente, provinda do lado nascente. 

Aos mais observadores, no entanto, algumas mudanças nessas médias de calor se apresentam com maior nitidez, destaque para os quatro últimos meses do ano. 

Segundo estudos científicos, se registra na Terra o chamado efeito estufa, que corresponde à retenção de calor pela concentração de gases de diversos tipos. A intensificação desse fenômeno ocorre com a emissão de poluentes e é responsável pelo aumento da temperatura global, o que pode causar sérios problemas ambientais.

São gases que impedem a dispersão dos raios solares, de maior concentração, o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4), o óxido nitroso (N2O) e compostos de clorofluorcarbono (CFC). A maioria deles originária da queima de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e derivados), florestas e pastagens.

O mecanismo de retenção de calor é semelhante ao de uma estufa de plantas com teto de vidro, permitindo que a energia luminosa penetre na atmosfera impedindo que a radiação proveniente da superfície aquecida se dissipe. 

A maioria dos gases causadores do efeito estufa também é gerada naturalmente na atmosfera terrestre e sem eles não haveria vida no Planeta. O metano, por exemplo, é produzido na decomposição de matéria animal e vegetal.

O ritmo acelerado de industrialização e poluição, porém, aumentou a quantidade desses gases e afetou o equilíbrio ecológico. O simples crescimento demográfico, o aumento do número de animais criados para alimentação e a decomposição dos dejetos orgânicos produzidos são outras causas do problema. 

O desmatamento de florestas também é um fator agravante, uma vez que as árvores absorvem dióxido de carbono.

Torna-se difícil prever a escala e os efeitos do aquecimento provocado pelo fenômeno climático, e há movimentos, debates e estudos científicos em andamento.

Segundo estimativas do Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas, a temperatura média subiu 0,6°C no século XX, e pode elevar-se em mais 1°C até 2030. Até 2090, a projeção indica aumento de até 4°C, caso medidas de prevenção não sejam tomadas.

Assim, vistas observações da Ciência, a percepção de mudanças drásticas no clima também reclama dos que vivem aqui urgências de preocupação com o pouco de natureza original que ainda resta, determinando aos órgãos responsáveis a conservação das matas e dos mananciais de água, além de alteração nos hábitos equivocados de cultivo do solo, quais medidas permanentes para manter os valores essenciais da sobrevivência. 

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Espelhos, fitas e bugigangas

Os comerciantes da Companhia das Índias Ocidentais por certo nunca imaginaram que, quatro séculos depois, outros usariam com os nativos do Novo Mundo o mesmo estilo de persuasão adotado na conquista da Colônia, isto é, pedras coloridas, cacos de espelhos e fitas variadas. Desta vez, em forma de novelas, enlatados estrangeiros e pesquisas de laboratório, jogados, em horário nobre, nas praias e florestas dos vídeos acesos.

Quando a eletrônica acelerava o processo da comunicação, inovando técnica e burocracia dos escritórios e bancos, surgiram alguns livros que denunciavam o risco ao qual se submetiam cidadãos comuns, figuras de beduínos perdidos em deserto árido, de quem morreram os camelos, miragens várias e sol intenso. Admirável Mundo Novo. 1984. Fahrenheit 451.

O cinema acompanhou a literatura e concebeu clássicos proféticos, inclusive os trabalhos imortais de Chaplin, que alertaram para o perigo da massificação, onde elites dominariam as bases trabalhadoras através de botões e canais de informação cativos, viciados que nem dados viciados em mãos sujas.

Era na ficção científica, domínio subliminar do homem pelo homem-máquina, como haviam feito com os instrumentos de sobrevivência na economia autoritária. Alguns achavam romantismo exagerado, falta de alcance do espaço aberto para o aperfeiçoamento civilizatório.

Anos passados; nuvens dissipadas.

O encabrestamento ocorreu. Poucos atentaram à importância do uso da razão, neste momento de crise. Os estiletes de meios eletrônicos penetram lares, tais rios de luz inquestionável, reverência circunscrita aos porões dos ditadores. Quando Diogo Álvares Correia acendeu o estopim, selvagens perplexos, mas felizes, uivaram com a chegada de Caramuru, o deus do fogo.

Por preguiça ou indiferença, tantos desativaram raciocínios, que a força da televisão arrasta manadas, ainda que essas não desconfiem para onde seguem, famintas e tristes.

Huxley. Orwell. Bradbury. Os autores dos livros referidos estavam, em parte, inspirados quanto ao futuro. Apenas aspecto não previram, o poder maior da Consciência, pulo de gato que ainda resta à espécie entontecida...

No campo de combate das eleições presidenciais deste ano, comprovar-se-á um valor mais forte do que a prepotência e o engodo. Meios outros de comunicação, outros canais de tevê, perfilam-se contra o Grande Irmão global. Vozes democráticas firmaram baterias e apostam nos resultados favoráveis do universal sufrágio. Nem tudo estará perdido, portanto.

O cancro cresce, partes inteiras da massa se esfumam; chaminés escurecem os céus. Porém cores persistem no fundo infinito da tela enorme. O homem, qual pintor genial, esfrega os olhos, banha o rosto e ainda consegue criar certezas novas, pois valores verdadeiros sempre triunfam nos exemplos históricos, também aqui, na pátria de Macunaíma.

sábado, 20 de setembro de 2014

Dédalo e Ícaro

Esta semana me veio ao pensamento contar a história de Ícaro, personagem famoso da mitologia grega, filho de Dédalo, este um descendente direto de Zeus, sisudo pai dos deuses helênicos. Ícaro, o filho de Dédalo e da escrava Náucrete, segundo elementos fornecidos pelo site da Wikipédia, na rede mundial de computadores. 

Dédalo se refugiara em Tebas, no reinado do Rei Minos, em razão de haver morto seu sobrinho Talo. Lá no exílio forçado, saberia do nascimento do Minotauro, filho bastardo do soberano. A eles, Dédalo e Ícaro, caberia a tarefa idealizar e de construir o labirinto em que o monstro habitaria até ser eliminado por Teseu, outra história mitológica dos gregos.

Acontecimentos posteriores, por sua vez, dados motivos desconhecidos na história, Dédalo e Ícaro restariam prisioneiros do mesmo labirinto que projetaram. No esforço de fugir da prisão, o sábio Dédalo resolveu confeccionar asas utilizando penas de gaivota e cera de abelha, encontradas no interior da prisão. Com isso, visariam a liberdade, deixando atrás o labirinto.

Constavam das recomendações do pai ao filho que devesse voar afastado do Sol, evitando o calor excessivo que derretesse a cera das asas, e que se mantivesse longe do mar, pois a umidade sujeitaria causar peso maior às penas e prejudicar suas ações. 

Ícaro, no entanto, sob desejo intenso de chegar mais perto do Sol, desobedeceu ao genitor, voando na direção do astro rei, atitude que lhe custaria a própria vida, indo, em consequência, afundar na imensidão do mar Egeu. 

Dédalo, por sua vez, tomado de emoção profunda com a perda do único filho, banhado em prantos, seguiria sobrevoando a costa com destino a Sicília, onde obteria asilo na casa do Rei Cócalo.

As belas lendas e fábulas dos povos nos levam a lições milionárias, que, bem apreciadas na essência, aprimoram as práticas através de reflexões, fruto das vivências guardadas no fluir das longas epopeias...  

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Os penitentes

Naquela tarde de um dia chuvoso, percorrendo a distância entre a casa grande e nossa casa, acompanhado de pessoas adultas, ouvia qualquer comentário a propósito de que tal não era permitido pela Igreja; falavam como de algo em vias de se realizar, alguma coisa que tivesse a conotação de sacrilégio, porém de cunho inevitável. Enquanto isso, mostravam os vãos da calçada nua defronte à capela do sítio e suas paredes enegrecidas pelas marcas do lodo que escorrera do teto nas quadras raras dos invernos, antes que fossem feitas novas caiações. Pouco compreendi do assunto que abordavam. Recordo tão só, na ocasião, da presença festeira de alguns tetéus zoadentos, voando e pousando desarrumados no solo, para as bandas do engenho; nada mais.

Da casa em que morávamos, no alto de uma elevação do centro da propriedade de meu avô, vislumbrávamos uma das represas do açude grande. Ao lado, a menos de quatro dezenas de braças, situava-se a igrejinha, proporções monumentais aos olhos de criança. Quando anoiteceu, daquela vez, e chegou a hora de dormir, redes armadas, portas trancadas, candeeiros apagados, começou-se a ouvir dentro de casa, vindos pelas frestas de portas e janelas, e telhado, lamentos, cantos funéreos, litanias e os sons pesados da penitência.

Era Sexta-feira Santa, a data escolhida para executar o castigo. De cabeças cobertas pelos sacos de algodão cru, para esconder a identidade, camisas arreadas sobre calças de brim grosseiro, chinelos de couro curtido, os caboclos daqueles sítios latanhavam as costas com chiqueiradores de couro e pontas preparadas, ferros afiados e outros instrumentos de sacrifício, autopunição destinada, segundo eles, a resgatar o que os homens fizeram a Jesus, na Palestina. 

Do quarto onde dormíamos se podia ouvir com nitidez aquela função de sofrimento e lamúria, qual se ocorresse no terreiro de casa. Em meio ao escuro, as estocadas, os gritos e o choro sentido de homens, lapeadas monótonas dos relhos cruéis fundindo-se na via dolorosa, a produzirem impressão de terror e ameaça no sentimento de quem nada soubesse do que lá fora acontecia. Avisos de cerimônia esquisita, sem termos de comparação infantil, de um surrealismo macabro..  

Nenhuma explicação daquelas horas de angústia veio a ser ministrada de quem quer que fosse. Ficaram registrados apenas os acordes pavorosos da estóica dança, a se arrastar noite adentro, no rumo frio da madrugada sertaneja. Esses personagens rudes usam ainda nos dias dagora essa prática de cilício penitencial, num conceito arcaico de propiciação ao desconhecido, à eternidade, justiça da execução, na cruz, do Mestre divino, o que vim bem depois a conhecer.   

No dia seguinte, manhã logo cedo, levados pelos que cuidavam das crianças da casa, eu e os outros meninos observamos de perto o palco do drama encenado através das sombras noturnas. A calçada tosca da pequena capela via-se lastrada de manchas escuras do sangue derramado na véspera, entre as flores de malva braba e espinhos de carro-santo, as urzes do chão em volta, testemunhas impassíveis da coreografia exótica.             

Cariri Cangaço 2014

Neste final de semana, de 12 a 13 de setembro de 2014, estivemos, Jorge Emicles e eu, em Lavras da Mangabeira, Ceará, participando do Cariri Cangaço (O Rosário e o Bacamarte), realizado naquela cidade. Sob o apoio da municipalidade e da Academia Lavrense de Letras, se viveu de perto um evento promovido pelos estudiosos do fenômeno da violência conhecido por cangaço, e que retrata a história do feudalismo do Sertão nordestino, vivido desde o século XIX à primeira metade do século XX, período anterior à Revolução de 1930.


Sob a liderança profícua do pesquisador Manoel Severo Barbosa, o movimento investigativo, que cresce ano após ano, vem ganhando corpo e recolhendo, na memória recente dos rincões palco dos seminários, os elementos necessários à melhor interpretação dos acontecimentos do Nordeste, trabalho de importância relevante, dado o esforço de aprimorar o conhecimento da grei interiorana, só de raro alçada aos salões da academia.

Na ocasião, o escritor Dimas Macedo, natural de Lavras da Mangabeira e atual presidente da Academia Lavrense de Letras, fez palestra na Câmara Municipal sob o tema Padre Cícero, Dona Fideralina e a Revolução de 1914, revelando, inclusive, aspectos até antes desconhecidos da crônica histórica, quais a participação expressiva do Cel. Gustavo Augusto Lima nas lutas que culminaram na destituição de Franco Rabelo do comando cearense, consequência da Rebelião de Juazeiro do Norte, e o capítulo da presença de Padre Cícero Romão Batista em terras lavrenses do (hoje) distrito de Quitaiús (antigo São Francisco), após deixar o município de Salgueiro, em Pernambuco, isto diante das perseguições que sofrera por parte da Igreja Católica face aos denominados milagres do Juazeiro.


Em São Francisco de Lavras, o sacerdote permaneceria na residência do agricultor José Alexandre de Oliveira (Cazuza Alexandre) durante sete meses, quando celebrou missa e outros sacramentos, e aconselhou a população do lugar, ocorrência que ainda agora permanece consignada nos objetos e relíquias que estavam em exposição na praça principal do Distrito, quando os viemos conhecer e fotografar, na manhã de 13 de setembro, segundo dia das atividades.



O brilhantismo da iniciativa também somou a encenação de Auto dos Penitentes pelas ruas de Lavras da Mangabeira, protagonizada por Dimas Macedo; Cristina Couto, Secretária de Cultura do município; poeta Mundoquinha; Grupo de Penitentes de Quitaiús, dentre outros figurantes.  

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

O deus de duas faces

Falar de Jano, ou Janus, em latim, reverte à memória de um deus romano cujo nome batizaria o primeiro mês do calendário (janeiro), o começo do ano. Ele se vincula às portas, ao entrar e sair, também às transições nos acontecimentos. Enquanto isso, sua face dupla significa passado e futuro nas espirais do tempo. Era o deus dos inícios e chegava sempre no instante das decisões e das escolhas.

As representações artísticas lhe mostram, de comum, na tradição, qual figura feminina e masculina, em única forma. Nalgumas vezes, num dos lados, imberbe. No outro, barbado. As características da imagem o indicavam a olhar cada face em direções opostas.

Aspecto que diz respeito a Jano o relaciona às guerras, conquanto  anunciava seus começos e términos. Enquanto durassem os conflitos, os templos a ele dedicados permaneciam abertos, já ficando fechados durante os períodos de paz, tradição que perduraria até o século IV d.C., comportamento que, segundo Tito Lívio, só aconteceu duas vezes em oito séculos.


A correlação entre as mitologias grega e romana quase sempre conduzem a deuses de iguais parecenças, o que, no entanto, deixou de ocorre quanto a Jano, sem similar entre os gregos.


O poeta romano Ovídio, na obra Fastos, consigna o deus sob as seguintes palavras: Os Antigos chamavam Caos a esta divindade que, originalmente, não tinha sequer forma. Quando da criação dos elementos que hoje temos, esta bola de massa transformou-se então no corpo de um deus. E ainda acrescentou: Tal como as portas têm dois lados, e um porteiro fica por fora, também este deus era então o porteiro da corte divina, e com as suas duas faces podia então olhar para lugares opostos, tal como Hécate (com suas três faces) podia vigiar atentamente as intersecções das estradas.



Na concepção de Ovídio, as razões de as portas dos templos a Jano permanecerem abertas no decorrer das guerras seria o fito de que os guerreiros pudessem reencontrar o caminho de regresso à Pátria. E fechadas nos tempos de harmonia, a fim de impedir de a paz fugir pelas portas, se estas permanecessem abertas.

O cheiro do cio

Depois de suspender por alguns meses o contraceptivo da cachorra, isso após ter a primeira cria, reapareceu nestes dias o seu período de fertilidade, o que manifestou na desobediência de sair precipitada à rua quando abríamos o portão. Já Duba, o cachorro, perdeu a costumeira compostura, indo quase ao desespero, pois resolvemos isolar a fêmea e superar por decurso de prazo o período fértil sem a tradicional reprodução dos mamíferos. A razão de não ministrar o anticoncepcional, utilizado em duas outras ocasiões, é que nos disseram que deixasse vir a menstruação de tempos em tempos, pois isso afasta risco de câncer, segundo os técnicos no assunto.

Pois bem, Duba, destarte, vive inferno astral de enormes proporções face ao isolamento com que se defronta. Quero admitir por conta de haver aguardado longa fase de degredo e, diante do fenômeno da parceira disponível, sofrer a restrição ao instinto animal. Chega perto de nos desconhecer ao isolá-los. Mesmo assim, mediante as insistências come a ração, porém de olhos presos à porta fechada do canil onde, temporariamente, fica Feiurinha, a cadela.

De comum, antes, ao abrir o portão principal, forçosamente devíamos prendê-lo, sob pena de correr desesperado pelas imediações; valente e bruto, sujeitaria brigar com outros cães ou agredir pessoas. Agora imagino até deixá-lo solto e ver se aproveitaria a chance de fugir. No entanto esqueço a possível experiência, uma vez que dirige sentidos e aflição na atenção exclusiva da libido. E avalio que todo o instinto de liberdade que o levasse a correr pelas ruas restaria bem menor do que a fome extrema de sexo da função reprodutiva que lhe toca. 

Dessas observações das feras advém interpretar as histórias neste chão, de quanta paixão move os povos, o tamanho de poder que a sexualidade movimenta no ímpeto de preservar a existência da carne. E as implicações no âmbito dos seres humanos, criativos e ambiciosos, a lutar contra limites impostos pela moral dos bons costumes, a revelar o valor da civilização, que administrar os tais instintos e reduz a carga primitiva das primeiras épocas dos tempos.   

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O direito à vitória final

Certa vez li nalguma crônica que o autor sofrera quando, ao assistir a uma comédia, ria com gosto, o espectador logo da fila da frente se virou e fixou nele seus olhos agressivos de alguém incomodado devido a alegria que ele demonstrava. É que existem pessoas assim profundamente mal humoradas neste mundo a ponto de nem permitir que outros viajem dentro de si nas esperanças de transformar valores falsos de depressão e desânimo em tantos dotes da mais feliz das imaginações pouco achadas em fase de abuso e desencanto. 


Ser dotado do senso da liberdade e usá-lo requer, por isso, coragem, e coragem maior a todo tempo, na intenção de vencer até batalhas alheias, dos que curtem a derrota qual bandeira de satisfação permanente, a pretexto de sabedoria adquirida nos percalços comuns a gesto de morrer sem conta, pobres diabos da inconsciência. 

Norma de virtude, a existência de bons sentimentos internos pede força de vontade positiva a muito custo de criatividade e seleção, isso na disposição de ignorar o desamor das criaturas mal humoradas metidas a donas do pedaço de rua onde perderam as luvas da satisfação pessoal. Em ação de sobrevivência dos ânimos sadios, a atitude individual precisa de concentração, de prudência, alimento dos dias em revisão das horas amargas, porquanto a estrada possui alternativas de mudança sem que haja necessidade insistente de perdição. Hora nenhuma de desgosto justificaria a destruição dos viveres renovadores de possibilidades. Firmar os pés na luz clara das manhãs da alma, sonhar sonhos bons, acreditar na vitória, no sucesso, independente do título das notícias azedas que insistem querer passar às multidões, anula o vento frio da ingratidão. 

Os heróis da condição humana vivem soltos dentro do ser, independentes do que pensem adversários da vitória, razão principal de resistir sempre e resolver, a qualquer custo, construir a própria felicidade nas plenitude das alegrias.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Hora de saber

Nem sempre podemos ignorar, pois existe a hora de saber, quando todo mistério se desfaz. Sobre essa hora queremos falar, apoiados na indispensável atenção do leitor.

Tanto disseram sobre tantas coisas, enquanto o essencial permanecia posto à margem, que isso agora vem a lume, parido na força visceral da precisão, no chamado enigma humano, centro e motivo deste ligeiro comentário.


De início, abordemos o cérebro, que se compõe de uma figuração dupla, montado sob a estrutura dos dois hemisférios, que, articulados entre si, geram a sua função principal: o esquerdo e o direito, no dois da mesma concepção nas outras coisas naturais.


Chineses conheciam esses aspectos e os estudavam sob a designação de Princípio Único do Universo, ou Lei da Bipolaridade. Tudo tem que ter o seu contrário para poder existir - Yin/Yang.


No Egito Antigo, o sábio Hermes Trismegisto examinara o assunto, considerando que um mesmo princípio perpassa todas as coisas que existem.


Assim, obedecemos, mesmo que diante de aparentes desobediências, por nos achar submetidos à Lei universal.


Outros exemplos revelam as tais dicotomias complementares: mulher/homem; noite/dia; Lua/Sol; escuro/claro; doce/salgado; baixo/alto; negativo/positivo; frio/quente. Pares de equivalências se distribuem com perfeição, lições constantes dos valores eternos que os mantêm.


Onde pisarmos, cumpriremos as ordens eternas do Supremo Ser, criador do equilíbrio de tudo o que há.


Tais evidências persistem na energia elétrica, que apresenta os dois pólos: terra e fase, ou fogo. Terceira alternativa inexiste além da harmonia dessas lateralidades, totalizando a força. Quaisquer disfunções redundariam no desmantelamento e posterior inércia dos sistemas. Ao ocorrer desequilíbrio nos extremos, o barco da ordem irá a pique.


Quando falamos que o cérebro se estabelece nesses dois inter-complementos, vale observar também que são partes à procura do todo, conclusão dos estudiosos da alma nas várias escolas, isso que assegurar saúde mental por via de negociações conosco mesmos, na maior de paz interna e obtenção da almejada felicidade.


Vertentes religiosas, igualmente, indicam o nosso outro lado como a trilha do encontro rumo à evolução, plano elaborado pelos milênios afora, no processo denominado de Individuação pelo psicanalista suíço Carl Gustav Jung.


Jesus de Nazaré marcou a história sob o signo de Cristo (o Ungido de Deus), o Eu verdadeiro que nos ensina; Sidarta Gautama, por sua vez, ficou conhecido como Buda, o Iluminado da Ásia. Na Canção Sublime, dos vedas, Arjuna ouviu Krishna, a Suprema Personalidade Divina, que o conduziria à vitória maior sobre os exércitos da Ilusão. Já Saulo de Tarso mudou até de nome (Paulo) após encontrar o Cristo em pleno caminho de Damasco. Isto para citar alguns dos fenômenos mais notáveis de transformações que marcariam a História.

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Processo de Individuação

Das grandes limitações de superar a condição animal no entanto lutamos com disposição no sentido de vencê-las, pois jamais poderemos explicar a nós mesmos as causas fugir das batalhas que oferecem a chance de viver com qualidade e ser feliz como profissão e vitória derradeira. Isto nada tem de ilusão, porquanto a própria ciência das civilizações prova que existem os meios de vencer o passado delituoso das primeiras experiências humanas, próximas até dos instintos animais. 

Por exemplo, estudos da psicologia analítica de Carl Gustav Jung, psiquiatra suíço cuja fama sobrevive século depois do seu desaparecimento, contemporâneo de Sigmund Freud, outra vaca sagrada dos estudos da alma. Ele, Jung, denominou Processo de Individuação essa via de transformação possível a todos por meio do aprimoramento das práticas de existência. 


Segundo Jung, as pessoas dispõem do condão de chegar à totalidade e tornarem-se únicas, realizar em si o mistério da cura cósmica diante do desconhecido, livres da condenação de repetir erros sucessivos que ficarão atrás. 

O Processo de Individuação equivale, por isso, a instrumento justo de vencer circunstâncias históricas individuais, no ramerrão dos equívocos continuados. 

Independente de opções pessoais, o homem é capaz chegar à sonhada totalidade e realizar o Ser em Si. No íntimo mais profundo da essência impera a elaboração do auto-aperfeiçoamento e revelação de um infinito de eras na individualidade. 

Enquanto isso, no secreto de todos nós, a batalha de conhecimento elabora viver com intensidade religiosa a tal revelação, solução definitiva do que classificam de sofrimento, peleja de dois lados que se doem, durante a qual um  busca libertação e outro teme superar a rotina das águas rasas e alçar à salvação, obter a total superação dos percalços medíocres deste chão.

Há quem esqueça a qualidade espiritual e mergulhe de cabeça na aventura das ilusões perdidas. Ainda sabendo das limitações, vitória certa aguarda os vitoriosos que lutarem o bom combate com ânimo e desejo positivo.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Coragem moral

Ou a dignidade, essa boa fé que justifica viver neste mundo em paz consigo mesmo. Se não, a que se está aqui?... Profissões, fama, riquezas, informações guardadas, tudo o mais que perde o sentido quando some o valor pleno da dignidade face as razões da existência. Postular cargos, destaques, conduzir multidões, reunir patrimônio, são motivos pequenos diante da ordem natural que rege os acontecimentos deste chão. Correr atrás de ilusões pode explicar só enquanto a realidade permanecer à sombra dos dias. A poeira das circunstâncias humana, no entanto, demonstra claramente o nada de vender a alma ao preço das vaidades, pura perda de tempo, energia, saúde, juventude e oportunidade. 

Ainda assim, a ausência de sentido sujeita toldar de cinza os projetos sucessivos das pessoas, devido àquela tendência de passar nos cobres a essência de existir, submissos aos instintos imediatos, vítimas da facilidade em trocar por lentilhas o trato bom da verdade absoluta qual instrumento de busca da Perfeição. Poucos, talvez raros, demonstram compreender a urgência de conhecimento verdadeiro na prática das realizações individuais. Largam aos pedaços a juventude nas baladas e nos vícios, abandonado bestialismo que, de perto, acompanha o séquito dos desavisados.

Conquanto as respostas rasguem os olhos de gerações e gerações face aos frutos estragados que produziram as histórias melancólicas, inúmeros batem cabeça no erro. Padecem da teimosia de representar papeis secundários, esquecidos da possibilidade dos papeis principais, nos palcos das jornadas pessoais.

Nisso, o que bem caracterizaria crescimento evolutivo nesta escola do tempo, haverá inestimável infinito maravilhoso na Criação que vira mero prejuízo de irresponsabilidades e satisfações indiferentes.   

Quanto ao preço de ser digno se pagará, sim, pois este lugar provisório onde ora habitamos impõe condições por vezes extremas, dados limites da pequenez relativa das sementes que nascem com esforço. Isso lembra frase de  de Castro Alves, quando diz: Que sou pequeno, — mas só fito os Andes... E adiante persistirá sempre sol no caminho de quem aceita de viver com Dignidade as honras de ser feliz.

domingo, 7 de setembro de 2014

O parto das consciências

Ah! Essa vontade que ferve dentro da gente de ver nascer dia pleno ainda nas madrugadas, lá quando o que demora tanto sabe que há um sol a vir que nascerá esplendoroso na tela bem guardada dos destinos, e que tem a velocidade incontida dos sóis imensos das verdades a inundar cores de tudo no nada silencioso, promessa que se cumprirá à medida face a face do desejo de perfeição do ser que nasce durante o dia que rasga de luz o horizonte.


A vontade que permeia os detalhes nesse quadro fulgurante de saudade em forma de paz no coração das pessoas... Gotas caladas que persistem e as mãos ansiosas das outras emoções, vultos livres, calados, a tatear na solidão dos dias quais entes independentes que impacientes deslizam as lâminas de luz no vento das tardes repletas só do canto dos pássaros.

Olhares em volta esperam as palavras exatas que trazem as letras e preenchem o papel dos sons ocultos da visão dos cegos a brincar pelas campinas do espírito à busca da calma que contém susto e imensidão.

Traços de formas quais rastros de existências a vagar o infinito das horas feitos artesões do Conhecimento, às vezes trôpegos; outras, guerreiros de batalhas inexistentes no consigo próprio; apenas criaturas à procura do Criador que um dia veio e agora quer reencontrar aqueles que deixou nessa busca do Si da perfeição. E o Ser exato da essência viva da existência formula suas indagações e responde o dia que nasce fruto das gerações.

Sobreviventes, pois, das circunstâncias, garimpeiros do ontem que virou ruínas face aos passos harmoniosos da engrenagem que palpitam nos corações, o tempo, de desenhos maravilhosos do presente, riscam nuvens eternas pelo céu da Consciência. Assim, enquanto árvores realizam frutos, andarilhos do lugar onde vivem o sopro divino da História coletiva. 

O ferreiro de Barcelona

As trevas da Inquisição lastravam a Europa de terror e mártires. A Idade Média anulara os anseios religiosos da grande população através de cruel intolerância, solapando liberdades civis qual peste sulfurosa. Durante o século XIII, se cometeram ignomínias e atrocidades, ações que iam do confisco de bens a execuções sumárias, torturas e castigos inimagináveis.

No auge disso tudo, na cidade espanhola de Barcelona existia ferreiro afamado que ganhava a preferência dos executores na confecção de instrumentos requintados adotados pela repressão impiedosa. Suas algemas mereceriam mais respeito face ao primoroso zelo com que as manufaturava, sem existir quem pudesse superar na qualidade. Atendia com sobras as encomendas que viessem. De suas produções jamais alguém escapara. Um profissional e tanto o ferreiro daquelas peças de trancar os perseguidos da oligarquia religiosa que avassalava esse período trágico, no combate a idéias renovadoras e no escarmento das vítimas.

Pois bem, esse homem até se orgulhava disso: Ninguém se livraria das suas tenazes; ninguém, quando preso, fugiria dos atrozes mecanismos. O Infinito, porém, justo e sobranceiro, guarda lá surpresas, na ronda dos aparentes ditames da monotonia do tempo. 

Dias e noites passavam céleres, até que, durante festa de insistentes brindes, perante vasta multidão, o ferreiro, animado além do tanto nos assuntos do vinho, excedeu-se em palavras, deixando vazar segredos inconfessáveis aos quais chegara por via do prestígio adquirido junto à cúpula do Santo Ofício. Na carraspana, revelara notícias que determinariam seu próximo destino feito nas armadilhas da língua.

Coisa pior não poderia acontecer. Cairia desse jeito nas garras mortíferas do mesmo tribunal a quem servira com esmero. A equipe dos doentes espirituais, por meio de julgamento sumário, cuidou da sua condenação, ficando desfeita a velha aliança de ferreiro e cliente.

Após o pesadelo das primeiras horas, ele despertou desnudo em solo úmido de infecta masmorra, colado de frio a pedras ásperas. Sentiu preso nos pulsos pelos crivos de metal enegrecido. Entre dormido e acordado, buscou esperanças no manuseio profissional dos mecanismos que o retinham junto da tosca parede.  

Recobrou lentamente os sentidos para perceber (qual surpresa desagradável!) que se via atravancado nos braços e pernas por dois pares das algemas que produzira na quase na véspera da infausta comemoração onde perdera a liberdade, sentenciado ao merecimento torpe que antes auxiliava outros a experimentar. 

Em seguida e desencantado, se rendeu a esperar o improvável, como ocorre nas situações semelhantes, quando na medida com que medirmos medir-nos-á também a nós.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Katie King

Por vezes ouvimos dizer que após deixar este mundo até hoje ninguém voltou para trazer notícias do outro lado da vida, argumento esse utilizado na intenção de demonstrar pouco caso com relação à existência de outra dimensão além desta aonde mourejamos na esperança da imortalidade, de que falam os mestres e profetas.

A ciência, no entanto, dispõe de elementos suficientes para cobrir essa lacuna, através de acontecimentos registrados, por exemplo, na Grã Bretanha da segunda metade do século XIX, os quais a seguir descreveremos.

De 1870 a 1873, o cientista sir William Crookes, nascido em Londres a 17 de junho de 1832, promoveu em laboratório uma investigação detalhada com experiências de materialização do espírito denominado Katie King, utilizando a sensitiva (médium de efeitos físicos) Florence Cook, todas fixadas em quarenta e quatro fotografias batidas com raios infravermelhos.

Por meio de substância denominada ectoplasma, cedida pela médium, o espírito pode reconstituir sua fisionomia e se manifestar neste plano material, agindo pela própria vontade, inclusive a tocar instrumentos musicais naquela ocasião. Outro cientista, na Alemanha, Friedrich Zollner, também chegou a efetivar prática semelhante.

Quando, depois, perseguido pela comunidade científica inglesa, negou-se Crookes reeditar seus artigos sobre o assunto e evitou deixar circulassem as fotografias feitas do espírito, hoje depositadas em arquivo ao dispor dos que pretendem conhecer mais a propósito desse assunto.

Com aquilo, no ano de 1904, o físico inglês admitiu a liquidação definitiva do materialismo e confessou crença absoluta na sobrevivência dos que passam ao Além e de lá nos observam, conclusão apreendida nas citadas experiências. No livro intitulado Fatos Espíritas, relatou as fases de seus estudos, mostrando, sem margem de dúvidas, o poder extraordinário dos espíritos para recriar a forma que possuíram na carne, utilizando a matéria física em forma de ectoplasma.

Florence Cook caia em transe antes das materializações, ficando sob as influências do processo mediúnico na medida em que o espírito adquiria o domínio da situação, até se mostrar por inteiro, com o decorrer do tempo das várias experimentações, numa média de duas sessões semanais.

Seu rosto a princípio dava a impressão de ser oco por trás. Mais tarde preencheu-se, os crepes ectoplásmicos se tornaram menos abundantes e, um ano depois, ela já conseguia caminhar do lado de fora da cabine.

Portanto, no decorrer de três anos, Katie King, jovem filha de um corsário jamaicano do século XVIII, loura, alta, de pele e olhos claros, se materializava próxima da médium Florence Cook, jovem de quinze anos ao início dos trabalhos, pele morena, estatura mediana, olhos e cabelos castanhos, sob o testemunho presencial dos frequentadores do estúdio, inclusive provenientes de outros países. Dentre as inigualáveis contribuições de William Crookes no campo da Física e da Química consta a descoberta do quarto estado da matéria, o estado radiante.